Por Julinho Bittencourt
Querem proibir o proibidão. Já foi assim com o samba, com o Chico Buarque e com quem mais acharem que incomoda. Proibir o outro é o último estertor da prepotência. No entanto, quem proíbe hoje pode ser o proibido amanhã e vice e versa. A experiência humana nos mostra que o melhor caminho a seguir, sempre, é o da liberdade. Vale o velho e bom clichê do iluminista francês François Marie Arouet, mais conhecido como Voltaire: “Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei até o último instante seu direito de dizê-la”.
Proibir o funk ou a canção “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, dá no mesmo. Há 50 anos, o pavor aos comunistas justificou uma e, agora, o pavor ao crime organizado e, mais uma vez, o apelo à moral e aos bons costumes, justificam a outra. Nas duas situações, a proibição nos esconde discussões imprescindíveis.
O crime organizado está todos os dias nos telejornais. Nem por isso eles devem ser proibidos. Proibir os nossos medos não é a melhor forma de enfrentá-los. Drogas e exploração sexual são decorrências da miséria e da exclusão social entre outras mazelas e não de um ritmo musical.
Dia 07 de julho foi instituído, através de projeto da deputada Leci Brandão – curiosamente uma comunista, o “Dia Estadual do Funk de São Paulo” – que foi sancionado pelo governador Geraldo Alckmin – um católico convicto, o que demonstra claramente o tanto que pode ser saudável a convivência de contrários.
O evento foi comemorado em várias partes cidades. Numa festa plena de liberdade e criatividade, os meninos provam mais uma vez e sempre que a sociedade é capaz de separar o joio do trigo, o bem do mal, sem a interferência da censura alguma.
A sugestão legislativa
Jogar a água suja fora com o bebê dentro. É disso que se trata a Sugestão Legislativa do cidadão Marcelo Alonso, que pretende transformar o funk em crime. Antes tarde do que nunca, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado (CDH) aprovou, em 21 de junho, um requerimento para discutir a questão.
A medida lembra em tudo a criminalização do samba, fenômeno das primeiras décadas do século passado, onde um negro carregando um instrumento musical poderia ser preso. Junto com os sambistas, iam de cambulhada os capoeiras e praticantes de religiões afro-brasileiras.
De acordo com a proposta, os chamados bailes de “pancadões” estimulam a prática de crimes contra crianças e adolescentes, promovendo o uso, venda e consumo de álcool e drogas, bem como o agenciamento, orgia e exploração sexual.
Para virar projeto de lei, a sugestão ainda precisa ser aprovada na CDH. Na Comissão, a matéria vai ser relatada pelo senador Romário (PSB-RJ), que solicitou a audiência pública para discutir a questão e, se possível, desmontá-la de vez. Romário quer trazer para o debate no Senado o autor da proposta, compositores e cantores de funk, além de antropólogos que estudam o gênero musical. Entre os artistas listados pelo senador para opinar sobre o assunto estão Anitta, Nego do Borel e Valesca Popozuda — expoentes do estilo musical.
Fonte: Revista Fórum
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