domingo, 30 de abril de 2017

Quem ver um fracasso na greve geral


Cartazes da greve
CARTAZES CONVOCAM PARA A GREVE DO DIA 28 DE ABRIL, EM PORTO ALEGRE   

João Paulo Charleaux 28 Abr 2017 (atualizado 29/Abr 12h57) Carlos Pereira e Cláudio Couto falam ao ‘Nexo’ sobre a dimensão da paralisação e de como ela impacta ou não as decisões do Congresso.

Os grevistas que se mobilizaram nesta sexta-feira (28) pretendem barrar o avanço das reformas trabalhista e previdenciária no Congresso Nacional. Para isso, apostaram na abrangência nacional do movimento como uma demonstração de força. 

Há avaliações desencontradas a respeito de qual foi a amplitude da paralisação. Para seus organizadores, foi um sucesso, dada a alta adesão de categorias em praticamente todo o país. O ministro da Justiça, Osmar Serraglio, chegou a dizer, durante o dia, que o movimento foi um fracasso.

Quem vê um sucesso na greve geral  - FOTO: RICARDO MORAES/REUTERS - 28.04.2017

Ruas desertas no Rio
FOTO: RICARDO MORAES/REUTERS - 28.04.2017 HOMEM CRUZA RUA DESERTA NA ZONA PORTUÁRIO DO RIO DE JANEIRO EM DIA DE GREVE  

A CUT (Central Única dos Trabalhadores) - uma das centrais sindicais que convocou a greve - postou fotos e vídeos de manifestações e paralisações em todos os Estados brasileiros. De acordo com ela, isso prova que o movimento foi abrangente e exitoso. 

Em São Paulo, todas as linhas de ônibus foram paralisadas, com exceção de algumas regionais, operadas por cooperativas. O metrô funcionou apenas parcialmente. 

Os ônibus também pararam de circular na região metropolitana de Porto Alegre. Em Brasília e em Belo Horizonte, além dos ônibus, o metrô também deixou de funcionar. 

No Rio, o metrô operou normalmente, mas usuários de ônibus reclamaram de escassez de veículos pela manhã. A ponte Rio-Niterói teve o trânsito interrompido pelos manifestantes na parte da manhã, assim como várias rodovias do país, sobretudo no sudeste. 

As hashtags #BrasilEmGreve e #GreveGeral ocuparam o primeiro e o segundo lugares dos “assuntos do momento” no Twitter na manhã de sexta-feira (28). 

Foi “um sucesso total”, disse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Nem de domingo as cidades têm trânsito tão leve quanto eu vi hoje. O povo ficou em casa”, afirmou o petista, em entrevista à Rádio Brasil Atual. 

“Isso [apoio à greve] é uma clara demonstração que as pessoas resolveram paralisar em protesto contra a retirada de direitos que o governo vem fazendo. É uma satisfação saber que o povo brasileiro está tomando consciência” Luiz Inácio Lula da Silva Ex-presidente da República. 

À noite, em São Paulo, os organizadores chegaram a dizer que 70 mil pessoas protestaram contra as reformas no Largo da Batata, na zona oeste - a Polícia Militar não divulgou estimativa. 

Quem vê um fracasso na greve geral
Greve de 28 de abril de 2017, em Brasília
 FOTO: MARCELLO CASAL JR./AG. BRASIL MANIFESTANTES EM ATO CONTRA AS REFORMAS, EM BRASÍLIA   

O grosso das paralisações ocorreu na parte da manhã, se diluindo ao longo do dia. O movimento foi forte em São Paulo, no setor dos transportes, mas menos intenso em outras capitais. 

O governo considera que muitos trabalhadores não aderiram politicamente à greve. O que aconteceu é que eles foram simplesmente impedidos de chegar ao trabalho. 

A hashtag #EuVouTrabalhar também esteve entre as mais usadas no Twitter nesta sexta-feira (28), mas sempre atrás dos #BrasilEmGreve e #GreveGeral. 

“Não é uma greve nacional”, afirmou o ministro da Justiça, Osmar Serraglio em entrevista à Rádio Jovem Pan. “Estamos testemunhando piquetes, bloqueios, mas a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal e polícias estaduais estão sendo muito eficientes. Estão desobstruindo.” 

“Não temos greve. Não há greve. Há uma baderna generalizada, uma insatisfação daqueles que percebem que estão perdendo a fonte de recursos que os permitia manipular a vontade de nossos trabalhadores” Osmar Serraglio Ministro da Justiça.

Ao longo de todo o dia, grupos queimaram pneus e fizeram barricadas em rodovias. Houve confrontos violentos entre a polícia e manifestantes no Rio de Janeiro, onde ônibus foram incendiados. Em São Paulo, houve confronto entre PMs e black blocks depois do ato no Largo da Batata. 

Às 19h20, o presidente Michel Temer se pronunciou por meio de uma nota oficial. Das 182 palavras no texto, nenhuma era “greve”. Temer afirmou que “grupos bloquearam rodovias e avenidas para impedir o direito de ir e vir do cidadão, que acabou impossibilitado de chegar ao seu local de trabalho ou de transitar livremente”. 

O presidente disse ainda que o debate sobre as reformas “será realizado na arena adequada para essa discussão, que é o Congresso Nacional. De forma ordeira e obstinada”. 

A opinião de dois cientistas políticos Dois cientistas políticos, professores da FGV, Carlos Pereira e Cláudio Couto, falaram ao Nexo sobre a importância da paralisação desta sexta-feira (28) e seu possível impacto na tramitação das reformas. 

Qual a avaliação sobre a dimensão da greve? CARLOS PEREIRA Ela não foi trivial. Mostrou capacidade de organização dos sindicatos, que se sentiram diretamente afetados e prejudicados pelas reformas de Temer. Foi uma resposta às reformas trabalhista e previdenciária, especialmente à iniciativa de extinguir a contribuição sindical obrigatória, o que vai gerar uma perda estimada pelo Tribunal de Contas em R$ 3 bilhões aos sindicatos. Esse talvez seja o preço que os sindicatos tenham que pagar se a reforma vir a ser aprovada na sua integralidade, o que colocaria o movimento sindical num choque sem precedentes. Então, o que vimos foi os sindicatos tentando mostrar força, dizendo que não vão aceitar a situação de braços cruzados, ou melhor, vão cruzar os braços com radicalidade para impedir que isso aconteça. Trata-se de algo normal, salutar e que demonstra a maturidade da democracia brasileira. 

CLÁUDIO COUTO Ele foi um movimento de sucesso relativo. Não foi um fracasso, mas também não foi um sucesso retumbante. Você não deve medir o sucesso de uma greve geral - ou mesmo de uma greve qualquer - pelo número de pessoas que participaram de manifestações de rua. Você mede pelo número de pessoas que não foram trabalhar. Há muita gente dizendo “ah, não havia tanta gente assim na rua”. Não é isso o que conta. Conta o quanto de gente não foi trabalhar. O número de pessoas que não foi trabalhar - seja por adesão à greve, seja porque não conseguiu chegar ao trabalho - indica um relativo sucesso. 

Que efeito concreto essa greve pode ter sobre os políticos responsáveis por votar as reformas?

CARLOS PEREIRA É um efeito muito baixo ou mesmo inexistente, porque se trata de um governo que tem vida curta e que já não desfruta de popularidade. A estratégia de reforma é a estratégia de um presidente que não se preocupa em se reeleger e é também a forma de sobrevivência de todos esses políticos que vivem essa enxurrada de denúncias, e que dão sustentação ao governo. 

É muito pouco provável que esse governo ofereça um candidato competitivo em 2018. Consequentemente, é pouco provável que essas resistências nas ruas afetem o compromisso do governo com essa agenda. São reformas impopulares cujos resultados positivos não serão percebidos no curto e no médio prazos, mas isso não parece ser um problema. 

CLÁUDIO COUTO Num cenário de reformas tão difíceis quanto essas, você ter um movimento que, de alguma forma, produz mais pressão sobre os parlamentares pode acabar provocando mudanças de posição. Está havendo um ziguezague nas votações, mais até no sentido de deserções do que de adesões às reformas. Então, um movimento como esse, de uma forma ou de outra, joga mais pressão e obriga o governo a, pelo menos, ter uma estratégia mais cautelosa, talvez até postergando votações para poder refazer a sua base. 

Os políticos estão sensíveis à pressão das ruas? Por quê? 

CARLOS PEREIRA Sensíveis sempre estarão. Eles não podem ignorar. Mas os parlamentares, em sua maioria, não têm a sobrevivência política atrelada à insatisfação desses setores sociais. A principal variável que explica sucesso eleitoral na reeleição de parlamentares no Brasil é a capacidade de levar benefícios para seus eleitores locais. Como o presidente seleciona de forma discricionária como será a distribuição de recursos, os parlamentares mais fiéis recebem mais recursos e, em consequência, garantem mais sua sobrevivência parlamentar. 

Então, a despeito da pressão dos movimentos, a possibilidade de os parlamentares não mais apoiarem essa agenda do presidente é baixa. A não ser que realmente aconteçam mais e mais mobilizações, como ocorreu em 2013 e 2015, o que é improvável agora. 

CLÁUDIO COUTO As ruas são mais um elemento de pressão que será considerado na hora de tomar as decisões. Se o governo estivesse num cenário de céu de brigadeiro, se essas reformas não produzissem qualquer tipo de mobilização de rua, se votar nelas fosse tranquilo, tudo bem, não haveria problema. Mas quando você tem um movimento que catalisa um descontentamento, sai às ruas, ainda que com sucesso relativo, quando você tem adesão bastante razoável de segmentos da sociedade, você realmente produz alguma alteração. Como a decisão tende a ser apertada, isso tende a fazer alguma diferença. Talvez, obrigue o governo a ter uma estratégia mais cautelosa, mais prudente, que pode, por exemplo, adiar por algum tempo essa tomada de decisão.


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Fonte: www.nexojornal.com.br

sábado, 29 de abril de 2017

Greve. O único vagabundo aqui é aquele que teve preguiça e a incapacidade de ler os livros de história: Você.


Por Fernando Penello Temporão - Via Facebook - 27/04/2017 

ACORDA, FULANINHO CLASSE MÉDIA! SUA CLASSE SOCIAL SÓ EXISTE GRAÇAS ÀS GREVES E MANIFESTAÇÕES AO LONGO DE 100 ANOS.


Quando um sujeito de classe média diz que greve é coisa de vagabundo, eu fico com vontade de sentar com ele numa pracinha, comprar um algodão doce, respirar fundo e falar:

"Sabe fulaninho esperto, há 100 anos atrás não existia classe média. Não existia você. Não existia autonomia. Não existia profissional liberal. Nem existia assalariado. Há 100 anos atrás, fulaninho, existia uma pequena elite difusa que se transformou em burguesia, herdeira secular de terras, privilégios, favores e negócios que remetem aos regimes monárquicos, seja no Brasil ou na Europa. Essa elite era dona de tudo: das terras, das fábricas, dos meios de produção. E tudo o que o povão tinha era fome, sede, frio, calor e força de trabalho pra vender por QUALQUER merreca que essa elite quisesse pagar.

Sabe fulaninho, esse povão trabalhador, durante décadas, foi explorado, torturado, privado de tudo, em nome do lucro de poucos. E durante décadas esse povão precisou se unir, e lutou, combateu, apanhou, foi preso....até ser ouvido para, pouco a pouco (bem lentamente mesmo), à duras penas, conquistar direitos trabalhistas que hoje regulam o que você faz.

E foi esse povo que, consolidados os seus direitos, passou a ser um negócio chamado: classe média. Esse povo, com muito suor e sangue, inventou uma classe social potente e enorme que, no caso, Fulaninho, é a SUA classe social. Você é o resultado prático da luta, das greves, das manifestações, e de toda organização política feitas por gente que, por sua força de MASSA, de CONJUNTO, conseguiu mudar o paradigma do século 20.

Seja você um autônomo, dono de uma pequena ou média empresa, seja você um profissional liberal, um prestador de serviços... seja você o que for, você foi inventado por GREVISTAS e só existe porque GREVISTAS permitiram que você pudesse existir e ser livre.

Sem os grevistas, fulaninho espertalhão, hoje você estaria dormindo 3 horas por dia e almoçando água com pedra. Sempre na nobre companhia de um senhorio com uma CHIBATA na mão para que você nunca se esqueça quem manda.

O tempo passou, o mundo mudou, mas nem tanto. Eles continuam tendo o poder e sendo poucos. E os trabalhadores continuam sendo a maioria e fazendo da sua UNIÃO a única arma para garantir sua sobrevivência e seus direitos.

Acorda, fulaninho! O único vagabundo aqui é aquele que teve preguiça e a incapacidade de ler os livros de história:

Você  "

Fonte: http://causameespecie.blogspot.com.br/2017/04/greve-o-unico-vagabundo-aqui-e-aquele.html

Laymert Garcia dos Santos: "Não tenho lembrança de uma greve com esse alcance"

Laymert Garcia dos Santos
 Sobre a Globo: "Boicotaram a greve ontem, mas hoje tiveram que fingir uma surpresa de que tinha uma greve"
Apesar do bloqueio de informação e da "tentativa da mídia tradicional de provocar um ruído na convocação", unidade popular e sindical levou movimento a "todo o lado e toda a parte", diz sociólogo

por Eduardo Maretti, da RBA*   

São Paulo – Ainda antes de um balanço final sobre o dia 28 de abril e da greve geral que paralisou grande parte do país, o sociólogo Laymert Garcia dos Santos afirma que as mobilizações e a greve em si, finalmente, permitem vislumbrar o horizonte com otimismo. Ele destaca a “amplitude e grau de penetração” da greve entre a população.

“Não foi só nas grandes cidades, mas em todo o lado e toda a parte. Primeiro, porque os sindicatos, centrais e movimentos sociais estão unidos e com uma capacidade de organização impressionante. Apesar do bloqueio de informação e da tentativa da mídia tradicional de provocar um ruído na convocação, não tenho lembrança de uma greve com esse alcance.”, diz. “Você abre portais na internet e vê uma tentativa totalmente enviesada de informar o mínimo possível e desinformar o máximo.”

No contexto midiático, a reação da Globo foi interessante. “Eles boicotaram a greve ontem (27), mas hoje de manhã tiveram que fingir uma surpresa, de que tinha uma greve. Ou seja, acabaram tendo de falar sobre isso de alguma maneira.”

O sociólogo destaca ainda como marcante o posicionamento do líder do MTST e coordenador da Frente Povo sem Medo, Guilherme Boulos, apontando para desdobramentos futuros do movimento, sublinhando  que, mesmo tendo sido histórica, as mobilizações não param por aqui, pelo contrário. “Boulos colocou essa greve como um marco não apenas de um acontecimento histórico, mas dizendo que esse marco vai trazer efeitos para uma mobilização futura. Isso, sobretudo, conta muito”, avalia.

“Quando a gente diz que nunca aconteceu uma coisa tão importante como essa greve, é como se tivesse chegado num pico e então só pudesse declinar, já que se chegou no máximo. Acho que hoje não foi o máximo, esse é o começo que mostrou uma capacidade de luta que vai ter um efeito importante. É um marco, sim, mas é um marco para a frente. Isso é o principal”, acrescenta Laymert.

Em artigo na Folha de S. Paulo de hoje, Guilherme Boulos e Raimundo Bonfim, coordenador geral da Central de Movimentos Populares (CMP), afirmaram: “Caso os ouvidos de Brasília permaneçam surdos à vontade da maioria, mesmo com o forte recado de hoje, o país poderá entrar de forma mais profunda na rota do conflito social. O ensinamento histórico é claro: quando se forma um abismo entre o povo e quem deveria representá-lo, abre-se o caminho para convulsões e desobediência civil”.


*http://www.redebrasilatual.com.br

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O indigesto e ruidoso recado das ruas para Temer e o Congresso

Largo da Batata
Temer parece disposto a contrariar a vontade popular. E o Congresso, demonstrará lealdade a quem?

Greve paralisa as principais cidades do País contra as reformas. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, houve confrontos e forte repressão policial.
Por Ingrid Matuoka e Rodrigo Martins*

As principais capitais
 do Brasil amanheceram na sexta-feira 28 com as ruas esvaziadas, o comércio às moscas, boa parte dos ônibus nas garagens, diversas estações de trem e metrô a portas fechadas. Os pontos de congestionamento se concentraram em torno dos bloqueios de grandes avenidas e rodovias. Parcela significativa da população optou por permanecer em casa após a convocação das centrais sindicais para greve geral. O movimento nas vias públicas só aumentou à tarde, quando começaram os atos contra as reformas trabalhista e da Previdência, também convocados pelos movimentos sociais que integram as frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo. 
As pesquisas de opinião já captavam uma forte rejeição popular às reformas propostas pelo governo de Michel Temer. Agora, a insatisfação refluiu para as ruas. De acordo com estimativas das centrais sindicais, cerca de 40 milhões de brasileiros cruzaram os braços e não saíram de casa pela manhã, o que explica o clima de feriado que contagiou diversas capitais. Além dos trabalhadores do transporte e da educação, ausência mais sentida pela população na sexta 28, houve forte adesão de bancários, petroleiros e metalúrgicos. No período da tarde, dezenas de milhares participaram dos protestos realizados em mais de uma centena de municípios, sobretudo nos maiores centros urbanos.
Em Belo Horizonte, uma passeata reuniu 50 mil manifestantes, segundo os organizadores. Na capital gaúcha, o dia começou com bloqueios em garagens de ônibus e terminou com volumosas marchas pelo centro. Em Curitiba, uma multidão se dirigiu à porta de Federação das Indústrias do Paraná para fazer a devolução simbólica de patos de borracha, símbolo do apoio dos empresários ao impeachment de Dilma Rousseff.
São Paulo, 70 mil manifestantes marcharam do Largo da Batata, na zona oeste da cidade, até a residência do presidente da República, localizada em Alto de Pinheiros. Ao avançar sobre o bloqueio montado pela Polícia Militar, os participantes foram repelidos com bombas de efeito moral e balas de borracha. No Rio de Janeiro, os 40 mil cidadãos reunidos na Cinelândia viveram momentos de terror, após policiais iniciarem uma violenta dispersão do ato, que até então transcorria de forma pacífica, com incidentes isolados. Também houve confrontos em frente à Assembleia Legislativa. Nas imediações do Passeio Público, adeptos da tática Black Bloc atearam fogo em ao menos nove ônibus.
A fábrica de ilusões do governo
A despeito do alcance da mobilização, o governo Temer fez o que pôde para minimizar o próprio desgaste. Primeiro, escalou o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, para vender a ideia de um “fracasso” da greve geral, antes de começarem os grandes atos, programados para o período vespertino. “Estamos iniciando o dia, mas aparentemente é uma greve que inexiste, uma greve dos sindicatos e centrais sindicais perturbados com a decisão do Congresso”, afirmou à Rádio CBN. A avaliação apressada foi reproduzida acriticamente pelos principais veículos de mídia, mas não resistiu ao desenrolar dos acontecimentos.
Rio de Janeiro
Temer lamenta o vandalismo, mas silencia sobre a violenta repressão policial (Yasuyoshi Chiba/AFP)
No fim da tarde, o presidente enfim se pronunciou por meio de nota. Alçado ao poder com a destituição de Dilma, Temer fez questão de enfatizar que as manifestações “ocorreramlivremente em todo País”, não sem criticar os grupos que bloquearam avenidas e rodovias "para impedir o direito de ir e vir do cidadão" e destacar os “fatos isolados de violência”, sem uma única e escassa linha sobre a violenta e desproporcional repressão policial vista no Rio de Janeiro (os confrontos em São Paulo ocorreram após a divulgação da nota).
Por fim, ignorou solenemente os apelos das ruas. “O trabalho em prol da modernização da legislação nacional continuará, com debate amplo e franco, realizado na arena adequada para essa discussão, que é o Congresso Nacional”.  A despeito dos fartos recursos destinados às campanhas publicitárias em prol das reformas, o peemedebista sabe que o seu projeto político jamais passaria pelo crivo popular.
A realidade desafia o discurso oficial
Uma pesquisa do instituto Vox Populi, encomendada pela Central Única dos Trabalhadores e divulgada há duas semanas, mostra que a rejeição às propostas do governo beira a unanimidade. O aumento da idade mínima da aposentadoria e do tempo de contribuição (mínimo de 25 anos), base da reforma da Previdência, é rejeitado por 93% da população. Oito em cada dez brasileiros também se manifestaram contra lei que autoriza a terceirização da mão-de-obra para toda e qualquer atividade de uma empresa, proposta já aprovada pela Câmara e sancionada por Temer.

Os pesquisadores consultaram, entre 6 e 10 de abril, 2 mil brasileiros com mais de 16 anos, de todos os estados e do Distrito Federal, residentes em 118 municípios. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais, para mais ou para menos.
Não por acaso, o presidente da CUT, Vagner Freitas, tem repetido que é o próprio presidente que mobiliza as greves. “Cada vez que ele se manifesta pelas reformas que retiram direitos dos trabalhadores, mais pessoas saem às ruas”, afirmou, em recente entrevista a CartaCapital. “Essa é uma pauta que mobiliza toda a sociedade civil, e temos fortes manifestações de oposição da CNBB, da OAB”, enumera.
Por conveniência, o peemedebista faz pouco caso da greve. A prudência recomenda outra atitude. O mesmo levantamento citado anteriormente revela que apenas 5% da população considera o desempenho de Temer bom ou ótimo. Segundo a pesquisa Barômetro Político, realizada pela consultoria Ipsos, a avaliação positiva é ainda menor, de 4%, e 92% dos brasileiros acreditam que o País está no rumo errado.
Não é tudo. A sondagem do Vox Populi também revela que 78% da população deseja a cassação de Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral, no processo que investiga ilegalidades nas contas da chapa Dilma-Temer. E 90% gostaria de poder substituí-lo em eleições diretas, e não pelo Parlamento, como prevê a norma constitucional. Essa é a razão da proliferação de faixas por “Diretas Já” vista nos atos contra as reformas.
Fora Temer
Entre 4% e 5% da população aprovam Temer, segundo diferentes institutos (Nelson Almeida/AFP)
O cenário é especialmente delicado porque não há sinais claros de retomada da atividade econômica, a despeito dos malabarismos retóricos da equipe de Temer. O desemprego não para de crescer, e fechou o primeiro trimestre de 2017 em 13,7%, o maior da série histórica iniciada em 2012 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
A voz rouca das ruas
Na prática, esse dado do IBGE, divulgado no mesmo dia da greve geral, representa um contingente de 14,2 milhões de desocupados no Brasil. É o caso do hoje ambulante André Santana, de 37 anos, que abriu espaço em meio a rodas de capoeira e intervenções artísticas do protesto no Largo da Batata, em São Paulo, para apoiar seu isopor e vender salgadinhos aos manifestantes. “Vim dar apoio ao pessoal e aproveitar para ganhar um dinheirinho, porque estou desempregado. Se antes já estava ruim, agora está muito pior”, diz Santana, que até pouco tempo era garçom.

Nem a garoa paulistana nem a baixa temperatura, que chegou a 14ºC, desanimou os manifestantes, entre eles crianças e idosos. A farmacêutica Luciane Kopittke, de 48 anos, compareceu ao ato com a família. “Estou aqui por eles”, diz, ao apontar o indicador para seus filhos, de 11 e 18 anos. “Todo mundo perde com essas reformas, mas eles são o futuro. É por eles que temos que lutar para preservar direitos”.
A professora Renata Mendes, de 39 anos, acredita que a greve é única forma de pressionar o governo e demonstrar a indignação da sociedade às reformas de Temer. “É a voz do povo vindo para a rua mostrar que somos maioria e que a nossa vontade importa”. O publicitário Chico Malfitani, de 66 anos, faz avaliação semelhante. “Mais do que o combate à corrupção, o que a gente quer é decidir sobre o nosso próprio destino”.
 Brasília
Até quando o Congresso vai ignorar a voz rouca das ruas? (Wilson Dias/ABr)
Ao desmerecer a greve, Temer buscava sinalizar para o Congresso que não há motivo para preocupar-se com a pressão popular. Resta saber se o discurso vai colar. “Se insistir nessa agenda, Temer só aumentará a sua impopularidade. Os deputados e senadores que quiserem morrer abraçados com ele vão votar com o governo”, diz Freitas, da CUT.

Para o líder do PT na Câmara, Carlos Zarattini, a grande adesão da greve geral dará segurança para os deputados dissidentes da base aliada se posicionarem contra a reforma da Previdência nas próximas semanas.
“Nós temos conseguido reunir até 180 votos: 100 da oposição e o restante dos dissidentes do governo, nem sempre os mesmos. Estamos com nível de traições bastante elevado. E vamos fazer ele crescer mais”, aposta Zarattini. “Acreditamos que uns 30 ou 40 deputados se juntem a nós contra a reforma da Previdência. E essa manifestação dá segurança aos deputados dissidentes para se opor a essas mentiras do governo”.
* Colaboraram Débora Melo e Tory Oliveira, de São Paulo, e Renan Truffi, de Brasília.
Fonte: Carta Capital

sexta-feira, 28 de abril de 2017

28 DE ABRIL: NATAL VOLTOU SE CONTRA AS REFORMAS DO GOVERNO TEMER! MILHARES COMPROVARAM ISSO!!!




















Greve foi a maior da história e pode abrir novo caminho para o Brasil

Manifestação no Largo da Batata, na capital paulista
Ricardo StuckertManifestação no Largo da Batata, na capital paulista 


E foi assim, com unidade das Centrais Sindicais, com o chamado de católicos, evangélicos, umbandistas que hoje misturaram suas cores e cruzaram os braços na maior greve geral da história do Brasil.

Só não participou quem julga que são os trabalhadores e os mais pobres que têm que pagar a conta da crise, do conluio que chantageia todos os dias o Estado brasileiro. Mas desses aí, ninguém sentiu falta, hoje eles inexistiam porque só queríamos encontrar quem estava em greve, construindo, debatendo, fazendo piquete e atos.

Esta greve entra para a história por estar inserida nesse contexto complexo e difícil, de extrema fragilidade e crise das instituições brasileiras. E por isso, essa união tão esperada é também tão importante.

O que faz a maior cidade da América Latina ficar totalmente vazia? A ameaça de um furacão, um atentado de organização criminosa? Não, não foi uma ameaça, foi luta em defesa da aposentadoria e essa força tão grande só ser significado da união e coragem desses setores que construíram a greve.

As fotografias das cidades vazias, dos ônibus enfileirados, dos bancos e metrôs fechados também gritavam: ainda sonhamos, estamos vivos, lutamos e vamos lutar por muito mais tempo. Afinal, de todos os embates que outras gerações antes das nossas passaram, a resistência e o brilho nos olhos de continuar acreditando que outro mundo é possível.

O Brasil pode ir dormir hoje mais tranquilo, não por ter conquistado a retirada da reforma da Previdência da pauta, mas por estar mais maduro para os embates em defesa da aposentadoria, da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT e de retomada da democracia, do crescimento e emprego.

Aqueles que participaram da greve e dos atos hoje, depois de muito tempo de agonia, também podem encostar a cabeça no travesseiro e dormir melhor, por hoje, o papel foi muito bem cumprido.

Dados

A greve geral teve adesão de diversas categorias que estão construindo a luta em torno da defesa da Previdência desde o início do ato. De acordo com as centrais sindicais, 35 milhões participaram das paralisações e protestos em todo o Brasil.

Em São Paulo, os metroviários pararam mesmo sob decisão liminar pedida pelo governador Geraldo Alckmin para esvaziar o movimento. Os condutores também paralisaram as suas atividades desde a meia-noite de hoje. 

Professores da rede municipal, estadual e particular participaram em massa em todo Brasil. Bancários, petroleiros, metalúrgicos também tiveram grande adesão. No ABC, berço da greve de 1979, seis montadoras e 60 mil trabalhadores cruzaram os braços em defesa da aposentadoria e contra a reforma trabalhista, que foi aprovada nessa semana na Câmara, após manobra do presidente Rodrigo Maia.

Alguns anteciparam os atos que comemoram o dia internacional do trabalhador, na próxima segunda-feira, dia 1º, e outros, para contar com a participação de setores que não estavam relacionados à uma categoria específica, também fizeram atos.

Em Porto Velho, mais de sete mil pessoas foram às ruas contra as reformas. No Pará, onde teve grande adesão dos bancários e professores, 100 mil pessoas bloquearam estradas, ruas, avenidas, fizeram atos e piquetes. Em Macapá, mais de 10 mil.

No Nordeste a mobilização dos atos foi grande. No Ceará, cerca de 500 mil pessoas participaram das paralisações e mobilizações em todo o estado. Em Salvador, de acordo com os organizadores, 70 mil; no Rio Grande do Norte 100 mil pessoas; e em Pernambuco, 200 mil manifestantes, conforme a Frente Brasil Popular Pernambucana, e em Sergipe, mais de 60 mil participantes.

Em Minas Gerais, só na capital, 150 mil pessoas participaram de atos, passeatas, paralisações. Em diversas cidades do interior mineiro também houve atividades. 

Em São Paulo, além da forte paralisação dos serviços essenciais, como Sabesp, educação e transporte público, no final do dia cerca de 70 mil pessoas participaram de manifestação que teve como ponto de concentração o Largo da Batata e foi até a casa do presidente Michel Temer, principal autor das propostas que retira direitos dos trabalhadores. No Rio de Janeiro, 40 mil pessoas participaram das paralisações e atos que foram fortemente reprimidos pela Polícia Militar.

No Mato Grosso reuniu cerca de 30 mil participantes e já no Mato Grosso do Sul, mais 60 mil pessoas. No Rio Grande de Sul, tanto a capital como cidades do interior também tiveram atividades da greve geral e no total contou com 50 mil. No Paraná, mais de 30 mil manifestantes.

Trancaços em defesa da aposentadoria

Uma das estratégias dos movimentos sociais foi a realização de bloqueios de principais avenidas, ruas e rodovias. Só em São Paulo, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública Estadual, mais de 50 trancaços foram realizados.

E entre os movimentos que fizeram os bloqueios também houve outra interessante unidade. Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, Movimento dos Sem Terra, Coordenação dos Movimentos Populares, Movimento dos Atingidos por Barragem, Movimento dos Pequenos Agricultores e a Coordenação Nacional das Associações de Moradia fizeram uma ação coordenada para travar pontos estratégicos próximos aos aeroportos, terminal de ônibus e metrô logo cedo.

A ação teve como resposta da Polícia Militar muita repressão e mais de 20 pessoas presas em Arthur Alvim e Ipiranga, somente em São Paulo.

Guerra nas redes sociais

A palavra greve geral uma das mais procuradas na internet nos últimos dias. Tendência que foi confirmada hoje. Desde às 4h00 da manhã, a palavra mais comentada no Twitter era #BrasilEmGreve.

A hastag utilizada de maneira alinhada por todos os veículos, meios, ativistas e os chamados influenciadores digitais do campo progressista, ficou mais de 10 horas no primeiro lugar entre os assuntos mais utilizados nas redes e chegou a desbancar sucessos da indústria cultural norte-americana.


Fonte: Frente Brasil Popular

quinta-feira, 27 de abril de 2017

Com 35 deputados, PSB oficializa decisão contra reformas do governo Temer

InfoMoney (Marcos Corrêa/PR)
© Marcos Corrêa/PR InfoMoney
SÃO PAULO - A Executiva Nacional do PSB se reuniu nesta segunda-feira (24) e aprovou posição contrária às reformas propostas pelo governo de Michel Temer. A Executiva nacional do partido aprovou por 20 votos a 7 posição contrária à reforma trabalhista e, por 21 a 2, posição contrária à reforma da Previdência.
A proposta da reforma trabalhista será votada amanhã na comissão especial, e na quarta-feira no plenário. Se a bancada obedecer a decisão serão 35 votos a menos para o governo. No Senado, o governo perde sete votos com a decisão do partido. 
Apesar do voto contrário, o comando do PSB, que ainda deve votar sobre a reforma política, não fez uma votação formal sobre a saída da base do governo por acreditar que não há necessidade, já que não houve indicação da legenda para um cargo no ministério. A indicação do deputado Fernando Coelho para o Ministério de Minas e Energia foi negociada com as bancadas do partido na Câmara e Senado, portanto, não caberia a Executiva deliberar sobre um rompimento formal. 
Fonte: MSN

Lobistas de bancos, indústrias e transportes estão por trás das emendas da reforma trabalhista

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Foto: 
Os textos defendem interesses patronais, sem consenso com trabalhadores, protocolados por 20 deputados como se tivessem sido elaborados por seus gabinetes
Alline Magalhães, Breno Costa, Lúcio Lambranho, Reinaldo Chaves:

Lobistas de associações empresariais são os verdadeiros autores de uma em cada três propostas de mudanças apresentadas por parlamentares na discussão da Reforma Trabalhista. Os textos defendem interesses patronais, sem consenso com trabalhadores, e foram protocolados por 20 deputados  como se tivessem sido elaborados por seus gabinetes. Mais da metade dessas propostas foi incorporada ao texto apoiado pelo Palácio do Planalto e que será votado a partir de hoje pelo plenário da Câmara.

The Intercept Brasil examinou as 850 emendas apresentadas por 82 deputados durante a discussão do projeto na comissão especial da Reforma Trabalhista. Dessas propostas de “aperfeiçoamento”, 292 (34,3%) foram integralmente redigidas em computadores de representantes da Confederação Nacional do Transporte (CNT), da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística).

O deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma na comissão especial formada em fevereiro para discutir a proposta do governo, decidiu incorporar 52,4% dessas emendas, total ou parcialmente, ao projeto substitutivo. Elas foram apresentadas por deputados do PMDB, PSDB, PP, PTB, SD, PSD, PR e PPS – todos da base do governo de Michel Temer. Reforçando o artificialismo das emendas, metade desses parlamentares que assinaram embaixo dos textos escritos por assessores das entidades sequer integrava a comissão especial, nem mesmo como suplente.

As propostas encampadas pelos deputados modificam a CLT   e prejudicam os direitos dos trabalhadores. O texto original enviado pelo governo alterava sete artigos das leis. O substitutivo de Rogério Marinhocontando com as emendas, mexe em 104 artigos, entre modificações, exclusões e adições.

Não falta polêmica para meses de discussão qualificada. Mas o governo decidiu encerrar o debate e colocar logo o projeto para voto,em regime de urgência. Numa primeira tentativa, não conseguiu votos suficientes para acelerar a tramitação. Mas, no dia seguinte (19 de abril), num movimento incomum, o presidente da Câmara,Rodrigo Maia (DEM-RJ), manobrou e conseguiu aprovar a urgência. Por ser um projeto de lei, se aprovado pela Câmara, vai direto para avaliação do Senado.

O tom geral da reforma é que o que for negociado entre patrões e empregados passa a prevalecer sobre a lei. O texto original enviado pelo governo, no entanto, não deixava isso explícito. Falava que o acordado teria “força de lei”, mas as empresas conseguiram emplacar emenda para deixar essa força do negociado mais evidente. Com isso, a redação nesse ponto passou a ser que os acordos “têm prevalência sobre a lei”.

As emendas aceitas também preveem restrições a ações trabalhistas. Deputados encamparam pedidos das associações empresariais para que o empregado, quando entrar na Justiça, passe a determinar o valor exato de sua reclamação e que o benefício da Justiça gratuita somente seja concedido àqueles que apresentarem atestado de pobreza. Ainda no campo da negociação entre empregadores e empregados, apesar de o que for acordado ganhar peso sobre a lei, ele não pode ser incorporado ao contrato de trabalho. O objetivo é forçar novas negociações a cada dois anos.

Outro exemplo de vitória das empresas em suas negociações no Congresso foi a incorporação da redução em 2/3 do valor do adicional que é pago a trabalhadores que têm seus horários de almoço ou descanso reduzidos – embora o Tribunal Superior do Trabalho tenha definido, por meio de súmula, que o valor a ser pago pelas empresas deve corresponder ao triplo do tempo “comido” pela empresa.

As emendas aprovadas também eliminam a necessidade de comunicação ao Ministério do Trabalho sobre casos em que houver excesso de jornada. O argumento, escrito por representante da CNT e aceito por parlamentares, é que “o empregado poderá recorrer à Justiça do Trabalho independentemente de comunicação à autoridade competente”.
Relações de gratidão
As propostas agora defendidas pelos deputados provavelmente não estarão em seus palanques ou santinhos nas eleições do ano que vem, mas certamente poderão ser lembradas nas conversas de gabinete para acertar apoio a suas campanhas. Embora o financiamento empresarial tenha sido eliminado, pessoas físicas ligadas ao setor podem doar e, embora seja crime, ainda é difícil imaginar um cenário próximo sem o caixa 2.
O vínculo de gratidão de parlamentares que aceitaram assumir como suas as emendas preparadas por lobistas das entidades empresariais é verificável pela prestação de contas da última campanha. Julio Lopes (PP-RJ), Paes Landim (PTB-PI) e Ricardo Izar (PP-SP), que apresentaram sugestões da CNF na comissão, receberam doações de Itaú Unibanco, Bradesco, Santander, Safra, entre outras instituições financeiras. Desses, somente Landim participava da comissão especial, e ainda assim como suplente.
 
O potencial conflito de interesse também aparece de forma clara no caso de parte dos parlamentares que assinaram emendas da CNT. A começar por Diego Andrade (PSD-MG), que, além de ter recebido doações de empresas que dependem de logística adequada para o escoamento de suas produções, é sobrinho do presidente da entidade, o ex-senador Clésio Andrade. O deputado apresentou 22 emendas à Reforma Trabalhista. Todas elas, sem exceção, foram redigidas por um assessor legislativo da CNT. O deputado Renzo Braz (PP-MG) também chama a atenção. Todas as suas 19 emendas foram preparadas pelo mesmo assessor. Além de ser de família ligada ao transporte de cargas, sua campanha de 2014 foi bancada majoritariamente por empresas do setor de transportes.


Uma das emendas idênticas apresentadas pelos dois deputados mineiros, mas não acatadas pelo relator, previa que, por exemplo, se um motorista perdesse sua habilitação, ele pudesse ser demitido por justa causa pela empresa que o tivesse contratado. Da mesma forma que os colegas “amigos” da CNF, Diego Andrade e Renzo Braz também não estavam entre os 74 integrantes da comissão especial da Reforma Trabalhista.
Lobby informal
Numa visão condescendente, o que as entidades empresariais estão fazendo no caso da Reforma Trabalhista e em outras situações menos visadas tem nome: lobby. A atividade não é crime, mas também não tem regras definidas no Brasil. Em países como os Estados Unidos, ela é regulamentada. No Brasil, há mais de uma década o tema é alvo de discussão, com divisão de opiniões sobre a conveniência da criação de regras. Uma vantagem é clara: isso traria mais transparência para a atuação de grupos de pressão privados.


No dia a dia do Congresso, lobistas circulam livremente entre gabinetes de deputados e senadores, quase sempre com o rótulo de “assessor legislativo”, gerente de “relações governamentais” ou “relações institucionais” de associações que reúnem grandes empresas – ou, por vezes, representando diretamente uma empresa específica.

A legislação atual impede que eles apresentem emendas diretamente, embora isso seja feito de maneira clandestina, como revela o levantamento do The Intercept Brasil.


No regimento da Câmara, a determinação é que as emendas sejam apresentadas somente por parlamentares. No mesmo documento, o artigo 125 dá poderes ao presidente da Câmara para recusar emendas “formuladas de modo inconveniente” ou que “contrarie prescrição regimental”. Não há notícia de que o mecanismo tenha sido usado em algum momento para barrar emendas preparadas por agentes privados.

Advogados consultados pelo The Intercept Brasil divergem sobre a existência de crime a priori na produção de emendas por agentes privados.
Advogados consultados pelo The Intercept Brasil divergem sobre a existência de crime a priori na produção de emendas por agentes privados.

“No caso do parlamentar, existe uma injeção ainda maior de dolo e é evidente o crime de corrupção passiva, justamente ao usar informações produzidas por uma entidade privada na esfera pública”, afirma Rafael Faria, professor de Processo Penal na Universidade Cândido Mendes, no Rio de Janeiro.

Segundo Faria, os parlamentares deveriam produzir emendas e suas justificativas por meio dos seus assessores contratados para trabalhar nos seus gabinetes, pagos com dinheiro público para exercer esse papel de assessoramento técnico e jurídico.

“Existe uma vantagem indevida, não sabemos qual é ainda, mas isso somente uma investigação poderá revelar. Mas que há, não tem dúvida. Não importa se o deputado não recebeu dinheiro de doações declaradas, é necessário que ele respeite as regras de compliance. Não trazer pareceres privados para a área pública”, argumenta.

Por outro lado, Carolina Fonti, especialista em Direito Penal Empresarial e sócia do escritório Urquiza, Pimentel e Fonti Advogados, acredita que é necessário verificar se houve vantagem indevida em troca das emendas antes de enquadrar no crime de corrupção.

“Mais uma vez verificamos que processo legislativo pode enganar ou esconder interesse escusos da sociedade. Identificada uma vantagem eventual, futura ou apenas prometida aos deputados, podemos então ter o crime de corrupção”, afirma.

O senador Romero Jucá (PMDB-RR) apresentou, no ano passado, uma PEC (47/2016) com apoio do governo para regulamentar o lobby no país. No campo legislativo, sua proposta prevê que lobistas possam apresentar emendas a projetos em tramitação no Congresso. A tramitação está parada no Senado, aguardando designação de relator na Comissão de Constituição e Justiça.

Criação e clonagem
Para chegar às 292 emendas redigidas pelas associações empresariais, The Intercept Brasil examinou todas aquelas protocoladas até o fim de março – antes, portanto, da apresentação do relatório de Rogério Marinho. Dentro dos arquivos PDF com o conteúdo da emenda e sua justificativa técnica, há metadados que indicam o “autor” original do arquivo, com a identificação do dono do computador onde ele foi redigido.


Há os casos que seriam naturais na atividade parlamentar, em que assessores do gabinete do deputado ou mesmo consultores legislativos da Câmara são os “donos” do arquivo. Mas em 113 deles o autor era um funcionário de uma das quatro entidades empresariais citadas na reportagem. Esses mesmos textos e justificativas foram clonados, inclusive mantendo eventuais erros de português, por outros parlamentares (veja aqui um exemplo, envolvendo os deputados Rômulo Gouveia (PSD-PB) e Major Olímpio (SD-SP).

Em alguns casos, o dispositivo a ser modificado na CLT era alterado, mas a justificativa permanecia exatamente a mesma. Na maioria das reproduções, o autor constava como “P_4189”, indicando o terminal de algum servidor do Congresso. Ou seja, um terminal específico serviu como “copiadora” de emendas originalmente redigidas pelas associações e que acabaram sendo apresentadas por diferentes deputados.

O parlamentar que mais assinou emendas apresentadas por associações foi Major Olímpio, candidato a prefeito de São Paulo nas últimas eleições e deputado do Solidariedade – partido fundado e presidido pelo sindicalista Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, que é justamente um dos principais opositores da reforma. Com discurso geralmente pró-trabalhadores, Olímpio, no último dia 24, postou em seu Facebook um chamado para sua base eleitoral:


Na Reforma Trabalhista, Major Olímpio apresentou 31 emendas – 28 delas escritas pelas entidades empresariais.


Mas nem tudo envolvia apenas associações empresariais. Há casos de deputados que defenderam emendas de interesse dos trabalhadores, mas preparadas também por entidades externas que atuam na defesa desses interesses. Ao menos 22 emendas foram redigidas pelo presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, Angelo Fabiano Farias da Costa. Elas foram encampadas por parlamentares do PT, PC do B, Rede e PDT, que têm posições majoritariamente contrárias ao governo Temer.

Também há emendas cujo autor original, nos metadados dos arquivos, consta como TST – presumidamente o Tribunal Superior do Trabalho, inclusive considerando o conteúdo das emendas. Nesse caso, foram 11 emendas com essa autoria, todas apresentadas pela deputada Gorete Pereira (PR-CE) e com conteúdo restritivo aos atuais direitos previstos na CLT. O presidente do TST, ministro Ives Gandra Martins Filho, é um dos entusiastas da tese do “negociado acima do legislado” e já foi apontado como artífice da Reforma Trabalhista apresentada pelo governo Temer.

As lições da Lava Jato
Os dados cruzados pelo The Intercept Brasil vêm de um modus operandi coincidente com o do esquema de corrupção revelado na Lava Jato e comandado pela Odebrecht – que, aliás, também era representada por uma associação empresarial, a Aneor (Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias), nos assuntos de interesse do Legislativo. Um dos delatores e ex-diretor da empresa, José de Carvalho Filho era dirigente da associação.


Os delatores revelaram em seus depoimentos aos procuradores que a relação corrupta construída com parlamentares envolvia, entre outros aspectos, a apresentação de emendas como contrapartida ao apoio financeiro já dado previamente ou como condição para colaborações financeiras futuras. É a promessa que, na avaliação da Procuradoria-Geral da República, caracteriza o crime de corrupção nos casos da Lava Jato. Um dos casos mais explícitos nesse sentido foi o de Romero Jucá, que apresentou quatro emendas preparadas pela Odebrecht à Medida Provisória 255 para que a petroquímica do grupo fosse beneficiada com redução de impostos.

Uma planilha organizada por Benedicto Júnior, outro delator, e apresentada ao Ministério Público detalhava montantes repassados a dezenas de políticos. Em um dos campos dessa planilha estava discriminado o motivo dos pagamentos. Uma das categorias apontadas no documento era “disposição para apresentar emendas/defender projetos no interesse da Companhia”. Um desses políticos, um deputado de codinome “Cintinho”, era Mauro Lopes (PMDB-MG), que agora aparece entre os parlamentares que se mostraram dispostos a assinar emendas de entidades privadas. No caso de Lopes, foram 24 assinaturas em documentos preparados previamente pela CNT e também pela associação das empresas de transporte de cargas.

O sigilo sobre as delações foi derrubado em 12 de abril. Na sequência, a imprensa, incluindo o The Intercept Brasil, publicou diversas reportagens sobre esse troca-troca promíscuo entre parlamentares e empresas privadas para a defesa de interesses comerciais no Congresso. A exposição dessa relação no mínimo controversa não impediu, contudo, que a CNF, a confederação dos banqueiros, usasse uma funcionária para entregar, no dia 19 de abril, no gabinete do deputado Antônio Bulhões (PRB-SP), ao menos seis emendas para serem assinadas e apresentadas por ele contra pontos do relatório da reforma.

“Sugestões pertinentes”
O deputado Julio Lopes (PP-RJ) afirma que “a emenda sugerida” pela CNF “veio de encontro com tese já defendida anteriormente pelo  parlamentar”. Disse ainda, em nota, que “recebe diariamente sugestões de propostas legislativas tanto de instituições como de cidadãos que pretendem contribuir para avanços no país”.


Major Olímpio, recordista de emendas apresentadas a partir das associações, afirma que sua função, como parlamentar, é “manifestar o anseio de todos os setores da sociedade”. “Apresentei emendas à reforma trabalhista, conforme meu entendimento sobre o projeto e outras conforme eu fui procurado e convencido da necessidade que o teor fosse colocado em debate”, escreveu o parlamentar, em nota.

Diego Andrade (PSD-MG), que apresentou somente emendas escritas pela Confederação Nacional do Transporte, disse que “as sugestões que acho pertinente, seja de projetos ou emendas, faço sempre uma análise jurídica e técnica, e apresento com convicção”. Acrescentou que “nosso gabinete continuará aberto a sugestões diversas, mas antes de apresentá-las sempre farei uma análise do mérito e nossa equipe uma análise técnica e jurídica”.

Rômulo Gouveia (PSD-PB) negou “veementemente” que “emendas, por mim apresentadas, foram elaboradas fora do meu gabinete”. Segundo ele, todas as suas emendas foram “discutidas e analisadas por minha assessoria técnica” e “confeccionadas no meu gabinete no dia 22 de março”. Contudo, no exemplo citado na reportagem, emenda idêntica apresentada por Major Olímpio foi protocolada cinco dias antes.

Gorete Pereira (PR-CE) nega que tenha apresentado emendas de autoria das entidades. Diz que, se elas estão coincidindo na redação, “eu não sei responder [a razão]”. “Respondo por todas que representei por achar que são importantes para a modernidade do Brasil”, disse.

Renzo Braz (PP-MG) e Paes Landim (PTB-PI), também citados diretamente nesta reportagem, não retornaram o contato até a publicação. Procuradas, nenhuma das entidades empresariais citadas comentou o teor da reportagem até o momento da publicação. Caso se manifestem, seus posicionamentos serão devidamente registrados.

Colaboração: Bruno Pavan, Jéssica Sbardelotto e Rodrigo Menegat


Créditos da foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Fonte: Carta Maior