Em entrevista ao Brasil de Fato, ex-ministro analisa conjuntura brasileira e avalia deficiências de governos petistas |
Por Rafael Tatemoto, no BdF
Apesar da convicção de que seria preso em breve, José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil no governo Lula e um dos principais formuladores políticos do Partido dos Trabalhadores (PT), se mantinha calmo quando recebeu o Brasil de Fato, na segunda-feira (14), para a última entrevista formal que daria antes de ter sua prisão determinada pela segunda vez.
Dirceu se apresentou à Polícia Federal (PF) na tarde desta sexta (18) para cumprir a pena de 30 anos e nove meses de prisão confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) na última quinta (17).
Quatro dias antes do prazo para, mais uma vez, ser encarcerado, o petista expressou apenas preocupações pessoais em relação à sua família. A grave situação não o impediu de realizar uma autocrítica em relação aos governos de que participou. Para ele, as questões centrais foram “subestimar a direita” e a “pouca politização e pouca disputa política” por parte do PT.
De outro lado, um diagnóstico otimista: “Não é impossível derrotar os golpistas nesta eleição”. Para isso, é necessário ter “um candidato único no segundo turno”. A conversa abordou também temas como junho de 2013, a relação do PT com a mídia e as opções políticas tomadas nos últimos anos. Confira a íntegra abaixo.
Brasil de Fato: A conjuntura atual é marcada pela queda de Dilma Rousseff. Quais deficiências da esquerda permitiram que isso acontecesse?
Zé Dirceu: O golpe tem razões estruturais. Se você olhar a História do Brasil, vai verificar que de tempo em tempo –conforme o nível de organização, politização e, principalmente, ocupação de espaços institucionais, no sentido eleitoral, de governo e parlamentar, como também de auto-organização das classes populares— sempre há uma interrupção do processo. Foi assim em 1964 e se repetiu em 2016. Em outros momentos houve tentativa de golpe, como em 1955, tentativa de impedir a posse de Juscelino. Em 1945, Getúlio foi deposto por um golpe da cúpula das Forças Armadas, elegeu Dutra, voltou nos braços do povo e foi “suicidado” em 54.
O golpe foi dado pelo que representavam histórica e estruturalmente a médio prazo as transformações que estávamos fazendo e o empoderamento político. As classes trabalhadoras criaram muitas vezes partidos, entidades, movimentos, mas foram abortadas pela repressão. Se você olhar a questão do pré-sal, dos bancos públicos, a política externa. A capacidade que o Brasil estava adquirindo, de ter autonomia, soberania e crescimento. As bases que estavam sendo criadas para um mercado interno, através da distribuição de renda. Participação nos Brics. Aqui a Unasul. O processo de crescimento de governos progressistas. Tudo isso pesou no golpe.
Nós estamos em uma situação muito diferente de outros momentos. Nós temos um candidato que ganharia as eleições, temos partidos políticos, movimento social, seja rural, urbano ou sindical. Tem um nível de organização. A correlação de forças é desfavorável a nós, mas temos uma base social e política, um legado. Há um nível de conscientização razoável para travar a luta, até mesmo a luta institucional. Tanto é que eles, para fazer a eleição, têm que inabilitar o Lula. Já fizeram outras vezes. Os militares cassaram Jango, Juscelino, Jânio, Lacerda, Magalhães Pinto, Adhemar de Barros. Eles perderam as eleições em 66 e perderem de novo em 74, para o MDB. E perderiam no Colégio Eleitoral em 78.
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