Sra. Nizan Guanaes entre “mucamas”, ao som de Caetano Veloso Reprodução/Instagram |
O ato racista da socialite, diretora da Vogue Brasil e esposa do publicitário baiano Nizan Guanaes, Donata Meirelles, que comemorou seu aniversário de 50 anos sentada em uma cadeira de sinhá e cercada de mulheres negras 'fantasiadas' de mucamas, dá uma noção a nós de até que ponto o fetiche da elite branca brasileira pela escravidão pode chegar.
A festa, que aconteceu no Palácio da Aclamação, em Salvador, foi frequentada por personalidades, artistas, famosos e subcelebridades que, a troco das boas relações com o centro do poder comercial brasileiro, passaram pano para o racismo e fingiram que nada relevante acontecia ali. De Caetano Veloso a produtores culturais, empresa´rios e jornalistas do metiê, ninguém sequer questionou o simbolismo da 'temática' da festa: o Brasil Colônia.
Nada de novo sob o sol, diria o próprio Caetano (que inclusive cantou durante a festança) em uma de suas canções. O que vimos foi mais um episódio do racismo brasileiro, subjetivo, engenhoso e disfarçado de 'homenagem'. E aplaudido por gente como o governador do Estado e o prefeito da capital, que se fizeram presentes.
Sob o pretexto de saudar a Bahia, Donata Meirelles evocou os fetiches, mas principalmente as saudades dos brancos ricos do País. Com sua festa de aniversário, a socialite terminou por festejar, de verdade, o maior desejo da mesma elite que construiu a candidatura vencedora da última eleição presidencial: o retorno da subjugação do nosso povo por eles.
Como a emenda é pior que o soneto, ao tentar se justificar por uma rede social, Donata afirmou que a comemoração não era temática e que a cadeira na qual ela e suas convidadas brancas sentavam para serem fotografadas não era de sinhá, mas sim um assento religioso do candomblé. Disse ainda que as mulheres negras não estavam vestidas de mucamas, mas sim de baianas, ofício que, lembrou ela, é considerado Patrimônio Imaterial.
Ora, sendo assim, nada muda. Continua evidente o tesão branco sobre as nossas tradições, que, na cabeça adubada por racismo deles, devem servir como cenário e fantasia para suas festas regadas a champanhe e nas quais, sabemos bem, nosso povo tem local e funções reservados: a cozinha, a portaria e o papel de garçons e garçonetes.
Não adianta Nizan Guanaes tentar trazer o ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama para a Bahia, se o episódio envolvendo sua mulher, do qual tratamos aqui, trata-se do velho e violento racismo estrutural, como bem pontuou em uma rede social a escritora Lilian Schwarcz: racismo tão enraizado e banalizado socialmente que parece não existir, que parece invisível. Mas existe, é visível, machuca, desrespeita e mata todo um povo.
O genocídio da população negra na diáspora africana no Brasil se dá de várias formas. Duas delas, o encarceramento e o extermínio físico, são mais concretas. Mas as outras, a exemplo da destruição subjetiva da nossa história e a zombaria comumente feita com a nossa dor, não são menos graves. São racismo. São práticas criminosas. E devem levar à cadeia.
Não sendo assim, brancos continuarão festejando a escravidão.
Yuri Silva, jornalista e coordenador-geral do Coletivo de Entidades Negras (CEN)
A festa, que aconteceu no Palácio da Aclamação, em Salvador, foi frequentada por personalidades, artistas, famosos e subcelebridades que, a troco das boas relações com o centro do poder comercial brasileiro, passaram pano para o racismo e fingiram que nada relevante acontecia ali. De Caetano Veloso a produtores culturais, empresa´rios e jornalistas do metiê, ninguém sequer questionou o simbolismo da 'temática' da festa: o Brasil Colônia.
Nada de novo sob o sol, diria o próprio Caetano (que inclusive cantou durante a festança) em uma de suas canções. O que vimos foi mais um episódio do racismo brasileiro, subjetivo, engenhoso e disfarçado de 'homenagem'. E aplaudido por gente como o governador do Estado e o prefeito da capital, que se fizeram presentes.
Sob o pretexto de saudar a Bahia, Donata Meirelles evocou os fetiches, mas principalmente as saudades dos brancos ricos do País. Com sua festa de aniversário, a socialite terminou por festejar, de verdade, o maior desejo da mesma elite que construiu a candidatura vencedora da última eleição presidencial: o retorno da subjugação do nosso povo por eles.
Como a emenda é pior que o soneto, ao tentar se justificar por uma rede social, Donata afirmou que a comemoração não era temática e que a cadeira na qual ela e suas convidadas brancas sentavam para serem fotografadas não era de sinhá, mas sim um assento religioso do candomblé. Disse ainda que as mulheres negras não estavam vestidas de mucamas, mas sim de baianas, ofício que, lembrou ela, é considerado Patrimônio Imaterial.
Ora, sendo assim, nada muda. Continua evidente o tesão branco sobre as nossas tradições, que, na cabeça adubada por racismo deles, devem servir como cenário e fantasia para suas festas regadas a champanhe e nas quais, sabemos bem, nosso povo tem local e funções reservados: a cozinha, a portaria e o papel de garçons e garçonetes.
Não adianta Nizan Guanaes tentar trazer o ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama para a Bahia, se o episódio envolvendo sua mulher, do qual tratamos aqui, trata-se do velho e violento racismo estrutural, como bem pontuou em uma rede social a escritora Lilian Schwarcz: racismo tão enraizado e banalizado socialmente que parece não existir, que parece invisível. Mas existe, é visível, machuca, desrespeita e mata todo um povo.
O genocídio da população negra na diáspora africana no Brasil se dá de várias formas. Duas delas, o encarceramento e o extermínio físico, são mais concretas. Mas as outras, a exemplo da destruição subjetiva da nossa história e a zombaria comumente feita com a nossa dor, não são menos graves. São racismo. São práticas criminosas. E devem levar à cadeia.
Não sendo assim, brancos continuarão festejando a escravidão.
Yuri Silva, jornalista e coordenador-geral do Coletivo de Entidades Negras (CEN)
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