O
jurista Fábio Konder Comparato não nutre esperança em relação à crise
política. A instrução dos processos a partir da lista de Luiz Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal
Federal (STF), vai demorar.
O
governo, de pouca legitimidade, e o Congresso desmoralizado continuarão
a aprovar reformas “inconstitucionais", salvo uma
intervenção do Ministério Público ou da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Os
políticos buscarão formas de escapar das acusações. E mais: Comparato não
descarta um novo golpe de Estado.
CartaCapital:
A divulgação da lista do ministro Luiz Fachin tira, de alguma forma, a
legitimidade do governo para fazer reformas como a trabalhista e a da Previdência ?
Fábio
Konder Comparato: Este governo nunca teve
legitimidade. Vivemos, no mundo todo, uma situação de total falta de rumo da
política. Do lado da direita, a fachada democrática do sistema capitalista rui
e todos percebem que não têm nenhum poder, nem mesmo de livre eleição de
representantes.
Do
lado da esquerda, a ideia fundamental de que haveria uma luta de classe entre a
burguesia e o proletariado torna-se inaplicável, uma vez que o proletariado em
si praticamente não existe como força política.
O
senhor disse que o governo nunca teve legitimidade. E o Congresso, que será o
responsável pela aprovação dessas reformas? Há 71 parlamentares na lista.
Grande
parte dessas reformas é inconstitucional. Eles não querem de maneira nenhuma
enfrentar esse problema e, se enfrentarem, terão o Judiciário a favor.
Os
projetos continuam a tramitar…
Exato.
Trata-se, porém, de saber se haverá ou não uma reação por parte do Ministério
Público ou da OAB, por exemplo.
E
no Congresso? A discussão e a aprovação dessas reformas pode perder força com a
divulgação da lista?
Os
parlamentares vão empurrar com a barriga e fazer o possível para a Lava Jato não avançar em relação a eles.
Agora será feita a instrução desses inquéritos. Vai levar um tempo
considerável. É bem possível outra intervenção extralegal para impedir a continuação
disso tudo. Não está fora de cogitação um novo golpe de Estado.
De
onde viria esse golpe?
Da
oligarquia, basicamente. A oligarquia no Brasil é composta de dois grupos
intimamente associados: os empresários e os proprietários, de um
lado, e os principais agentes do Estado, do outro. Evidentemente a Lava Jato desmoraliza ambos os grupos.
Qual
seria uma solução possível para a crise política?
A
solução não é rápida. Trata-se de lutar contra dois fatores fundamentais de
organização da sociedade: de um lado, o que eu chamo de poder oligárquico, ou
seja, o poder da minoria rica, estreitamente ligada às
instituições do Estado.
De
outro, a mentalidade coletiva, que não é favorável à democracia. Ela nunca
existiu no Brasil, pois o povo se considera inepto, incapaz de tomar grandes
decisões. Tivemos quase quatro séculos de escravidão, o que criou na
mentalidade popular aquela ideia fundamental de que quem pode, manda, obedece
quem tem juízo.
Débora Melo
Do CartaCapital
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