Assuntos polêmicos são comuns nas redes e infelizmente os acompanham posicionamentos preconceituosos, misóginos e medíocres também
Nesse momento, a internet está focada no caso de Marina Joyce, a YouTuber que chamou a atenção de todos nas últimas 24 horas nas redes sociais. A jovem de 20 anos mora em Londres e após publicar alguns vídeos com hematomas, fisicamente abatida e assustada, a tag #savemarinajoyce subiu para o topo dos TT’s mundiais e de lá não saiu mais. Quando acessamos a tag podemos ver milhares de fãs ou somente pessoas solidárias expressando sua preocupação. Muitas teorias foram criadas: uma delas é que a jovem vem sendo agredida e está gravando vídeos a força por seu namorado, outra versão é que ela está em cárcere privado e por isso não comenta sobre a violência física e psicológica que supostamente vem sofrendo. Uma maré de gente, no entanto, vem contrapondo a suspeita de violência e rebatendo com a suspeita que Marina, na verdade, “é só mais uma dependente química e que se está assim porque deseja”.
Não precisamos ir muito longe para lembrar de casos parecidos. Um exemplo no Brasil é da Deputada Federal Átila Jacomussi que sofreu agressão do seu marido e foi forçada a gravar um vídeo dizendo que estava tudo bem – mesmo aparecendo nitidamente abatida. Muitos a culparam por apanhar.
A mesma prática dos “juízes online” acontece tradicionalmente quando uma mulher é vítima de abusos sexuais, psicológicos e morais. Quem não lembra do caso da jovem Eloá Cristina, morta pelo namorado em 2008 – quando muitas pessoas apontavam para o caso dizendo que a culpa era da menina por ter se relacionado com alguém perigoso – ? Ou o caso de Cláudia, morta após ser baleada e arrastada por uma viatura da PM do Rio de Janeiro, que recebeu a sentença virtual de “criminosa”? E mais recente, o estupro coletivo de uma jovem de 16 anos por 33 homens, que gerou nas redes uma onda de ódio, culpa e perseguição à vítima após seu vídeo desacordada ter sido postado no Twitter. A jovem foi julgada no tribunal virtual como culpada por ter saído, por ter bebido, por se envolver.. mas e os homens? Até hoje não se sabe os nomes deles, e provavelmente nunca vamos saber.
Nos quatro casos temos um fator em comum: a criminalização da vítima. Por que toda vez que uma mulher demonstra que está sofrendo com algum tipo de abuso e/ou violência o instinto da maioria é sempre questionar o que ela estava fazendo? Ou melhor, por que toda vez que casos como de Marina e Atila chegam às redes, nós mulheres somos taxadas de loucas, drogadas, descontroladas? É esse papel que o machismo e o patriarcado cumprem em um mundo onde as mulheres ainda são subestimadas e inferiorizadas.
Casos como de Marina são comuns, infelizmente. Acontecem todos os dias, e muitos não chegam nem a ir para as redes ou para as delegacias por medo. Estamos em um momento no país em que vários setores estão mobilizados, seja contra o golpe, contra o roubo de merendas ou contra o fim das políticas sociais arduamente conquistadas.
A primavera feminista vem crescendo e contrapondo todo esse machismo historicamente enraizado, a emancipação toma conta de todos os espaços, inclusive das redes sociais. Não podemos deixar com que as redes virem o curral da elite brasileira, não podemos deixar que o machismo nosso de cada dia fale mais alto do que a empatia em tentar ajudar.
Por fim, um questionamento, quantas Marinas, Eloás, Atilas e Cláudias você já julgou no tribunal online esse mês e quantos desses julgamentos estavam errados?
Por Camila Lanes, Presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES).
Fonte: UBES