Enquanto a educação pública de São Paulo, o Estado mais
rico do País, passa por uma grande crise, algumas dezenas de escolas
pelo país conseguem resultados excelentes, mesmo em regiões pobres e com
condições difíceis. A Fundação Lemann, uma organização dedicada à
educação, divulgou esta semana a pesquisa Excelência com Equidade,
que lista 35 escolas pelo Brasil, que, mesmo com sérios problemas
sócio-econômicos, conseguem níveis de aprendizado altíssimos. A lista
tem algumas lições que podem inspirar São Paulo, onde há cerca de 200
escolas ocupadas por alunos, em protesto contra a reestruturação imposta
pelo governo do Estado.
Lição número 1: Mudar de escola é sempre difícil
Uma
constatação bem clara da pesquisa da Lemann é que quase todas as
melhores escolas públicas do Brasil são lugares onde os alunos passam
muitos anos - elas oferecem todo o ensino fundamental e médio, ou ao
menos o fundamental inteiro, do 1º ao 9º ano. Dessa maneira, conseguem
criar um projeto pedagógico claro que vai das primeiras letras e números
até a preparação para o mercado ou a faculdade. Além disso, os alunos
não precisam ficar trocando de escola no meio do ciclo, o que muitas
vezes é um trauma, ainda mais para um pré-adolescente que tem nos amigos
uma referência muito forte. "Mudar de escola é sempre um desafio", diz o
especialista em políticas públicas Ernesto Martins Faria,
coordenador-geral da pesquisa da Lemann.
Nesse sentido, a
reorganização proposta pelo governo de São Paulo vai na contramão da
excelência, já que a ideia é separar as escolas em três tipos: as que
oferecem os primeiros anos do fundamental (do 1º ao 5º), os anos finais
(do 6º ao 9º) e o ensino médio. "Não está necessariamente errado", diz
Ernesto. "Realmente isso otimiza recursos e faz sentido pensar escolas
com infraestrutura mais adequada para cada fase do aprendizado. Mas isso
só dará certo se houver um projeto muito claro para suavizar essas
quebras - o Estado tem que ter um plano para que o projeto pedagógico
não se perca a cada vez que os alunos mudarem de escola." Nada indica
que esse plano exista.
Lição número 2: Escola tem que ser parte da comunidade
Outro
padrão que apareceu claramente entre as escolas públicas que se
destacam no Brasil mesmo em condições difíceis é que elas costumam ser
referências muito fortes para a comunidade. Um caso extremo é o da
Escola de Ensino Fundamental Miguel Antônio de Lemos, em Pedra Branca
(CE), a 260 km de Fortaleza, sobre a qual a Superinteressante fez esta reportagem.
A escola de Pedra Branca é uma referência tão forte para a cidade que
toda a população sente-se incentivada a participar do ensino das
crianças, oferecendo aulas ou mesmo serviços a baixo custo. O resultado é
que o índice de evasão é zero e os funcionários da escola são
profundamente envolvidos na vida de cada criança.
Novamente esse é
um ponto de atenção para o Estado de São Paulo, que pretende fechar
várias escolas tradicionais, com laços antigos com a comunidade à sua
volta. "O ensino público precisa mesmo mudar, e a preservação desse
vínculo da comunidade com a escola não pode ser um empecilho para a
inovação", diz Ernesto. "Mas fechar uma escola que é uma referência
forte só pode acontecer depois de muita conversa com a comunidade." Não
foi o que aconteceu.
Lição número 3: O aluno é o protagonista, o Estado ajuda
Um
dos grandes problemas da educação contemporânea - não só na rede
pública e não só no Brasil - é a dificuldade de envolver os alunos, de
fazer com que eles sintam que aquilo é importante para eles. Para fazer
isso, só tem um jeito: levar muito a sério as opiniões deles, deixá-los
inclusive moldar em algum nível o ensino que é oferecido. "Neste
sentido, o maior problema dessa reorganização talvez não seja o que eles
querem fazer, mas o como", diz Ernesto. A reestruturação foi decidida
de cima para baixo, sem envolver a comunidade na discussão, passando a
sensação de uma intervenção de burocratas na vida da escola. Natural que
isso provoque uma reação negativa.
Na lista das escolas
excelentes, mesmo em regiões carentes, dois Estados se destacam muito:
Minas Gerais e Ceará. De um total de 35 escolas, 12 são cearenses e 15
mineiras. Ernesto diz que uma característica importante da educação
pública nesses dois Estados é que, em ambos, há uma proximidade muito
grande entre a administração e as escolas. "Em boa parte do Brasil, a
secretaria de educação apenas vai lá, aponta o dedo, diz que está tudo
errado e vai embora. Em Minas e no Ceará é diferente." Lá, as
secretarias de educação têm clareza do projeto pedagógico e são
reconhecidas pelas escolas, inclusive porque ajudam a lidar com os
problemas locais, em vez de apenas cobrar.
Conheça a escola pública no sertão cearense que é uma das melhores do Brasil
Fonte: Educar Para Crescer
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