domingo, 26 de janeiro de 2020

“Parasita” tenta pregar contra o capitalismo, porém reforça preconceitos contra os pobres

“Parasita”, o novo filme do diretor sul-coreano Bong Joon-ho (de "O Hospedeiro", “Okja” e “Expresso do Amanhã”), vem recebendo os mais altos louros da crítica, ao ponto de ter sido indicado a vários Oscars (inclusive Melhor Filme e Melhor Filme Estrangeiro!).

Confesso que não fiquei assim tão maravilhado. Obviamente acho louvável a tentativa do cineasta em, novamente, denunciar os males do sistema capitalista que separa os seres humanos em castas onde os mais pobres vivem amontoados em cubículos lutando para sobreviver, enquanto os ricos moram em mansões gigantescas em suas vidas fúteis e vazias. Essa, por sinal, é a mesma premissa da ficção científica “Expresso do Amanhã” que mostrava essa divisão de forma alegórica num futuro distópico situado dentro de um trem.

O problema básico de “Parasita” é que, enquanto pinta com tintas realistas a rotina e a psiquê dos personagens pobres, esquece de fazer o mesmo com os ricos. Assim, a família de Kim Ki-taek (o ótimo Song Kang Ho) faz de tudo para continuar sobrevivendo, incluindo aí roubar wi-fi dos vizinhos e aplicar golpes para conseguir trabalhos, construção que deixa os personagens bastante humanos e críveis. Todavia, o núcleo familiar dos ricos vai na contramão, mostrando pessoas que parecem apenas ingênuas, honestas e bem intencionadas, sendo as únicas características negativas deles um leve preconceito (expresso principalmente nas reclamações do patriarca sobre o cheiro ruim dos pobres) e a alienação.

Para que a crítica social almejada pelo diretor realmente funcionasse, ao ponto de atingir e conscientizar justamente aqueles a quem ela é dirigida (as classe mais ricas), a família abastada teria que ser apresentada com as mesmas tintas realistas que os mais pobres, ou seja, com nuances de caracterização que os fizessem menos caricatos. Poderia, por exemplo, apresentar o patriarca como uma pessoa corrupta, sem escrúpulos, e sua esposa como alguém racista.

Do jeito que ficou, o filme acaba manco e reforça os preconceitos contra as classes mais pobres que Bong Joon-ho tanto gostaria de combater, justamente de que são pessoas capazes de fazer qualquer coisa para melhorar de vida, inclusive mentir e até matar, enquanto os ricos são trabalhadores meritocráticos, ingênuos e bem intencionados.

“Parasita” tem cenas muito boas, um humor ácido afiado, movimentos de câmera primorosos e excelente atuações, porém o que pesa mais é a tentativa de “conscientizar” o espectador acerca da mensagem embutida no roteiro e, devido às falhas apontadas acima, acaba falhando justamente em sua maior pretensão. Uma pena.


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