domingo, 15 de janeiro de 2017

Articuladores do impeachment são responsáveis pela atual indignidade



A combinação de pessoas e ineficácias a que chamamos de governo Temer tem uma particularidade. Nos tortuosos 117 anos de República e ditaduras no Brasil, jamais houve um governo forçado a tantas quedas de integrantes seus em tão pouco tempo, por motivos éticos e morais, quanto nos oito meses de Presidência entregue a Michel Temer e seu grupo.

Entre Romero Jucá, que em 12 dias estava inviabilizado como ministro, e o brutamontes Bruno Julio, que, instalado na Presidência, propôs mais degolas de presos, a dúzia de ministros e secretários forçados a sair é mais numerosa do que os meses de Temer no Planalto.

Foi para isso que o PSDB, o PMDB, a Fiesp, o jurista Miguel Reale e o ex-promotor Hélio Bicudo, a direita marchadora e tantos meios de comunicação quiseram o impeachment de uma presidente de reconhecida honestidade?

Sim. À vista da ausência, nem se diga de reação, mas de qualquer preocupação entre os autores do impeachment, a resposta só pode ser afirmativa. Até antecipada pelo descaso, também ético e moral, dos aécios, da Fiesp, de reales e bicudos. Estes também são partes do governo Temer, como o PSDB, ou seus associados. Logo, tão responsáveis pela indignidade dominante quanto o próprio Temer.

O Geddel que começa a estrelar mais uma peça da ordinarice foi expelido do governo em tempo de evitar que as novas revelações explodissem em uma sala do Planalto. Mas é inesquecível que até poucas semanas Geddel disputava com Eliseu Padilha o comando de fato do governo. Instalado no centro da Presidência por desejo do próprio Temer, que fez o possível para inocentá-lo do favorecimento ilegal a um negócio imobiliário.

Não havendo petistas nem próximos de Lula envolvíveis, a Polícia Federal não se interessou. Se o novo escândalo chegar ao negócio que derrubou Geddel, porém, a PF verá que antes de uma frustração pode haver muitos lances bem sucedidos. Apesar de nada admiráveis.

Mais sugestiva do que a inclusão de Geddel no Planalto é sua nomeação para a diretoria da Caixa Econômica: foi escolha pessoal, o que vale como pedido, do então vice-presidente à presidente. E não qualquer diretoria, não. A de negócios com pessoas jurídicas. Empresas, empresários, projetos privados, sociedades de particulares com governos.

Michel Temer fez mesmo o serviço completo: como outra escolha pessoal, conectada ao PMDB, indicou também para a direção da Caixa ninguém menos do que Moreira Franco.

O que daí resultaria era tão óbvio que aqui mesmo, e logo, se pressentiu. Com a mesma obviedade, o que seria a entrega do governo a Michel Temer e seu grupo não ficou impressentido pela cúpula do PSDB, pelos reales e bicudos do impeachment. Tão responsáveis, hoje, quanto Michel Temer.

UM LIVRO

Dinheiro e interesses não políticos fizeram o lado (ainda) obscuro do impeachment. Os fatos, ideias e sentimentos que viveram o processo de dentro da Presidência e do governo eram o lado sombrio. Não são mais. "À Sombra do Poder – Bastidores da Crise que Derrubou Dilma Rousseff" os ilumina.

E o faz muito além do seu resultado presente. É um livro que ficará como referência. Jornalista e doutor em ciência política, o brilhante Rodrigo de Almeida se propôs a fazer um "livro de observação" –e conseguiu.

Secretário de imprensa da Fazenda com Joaquim Levy e, depois, da Presidência até a destituição de Dilma Rousseff, Rodrigo de Almeida faz uso tão objetivo do seu testemunho quanto seria possível. É jornalismo na melhor acepção da palavra.

Não teme falar do temperamento, das reações e dos erros de Dilma Rousseff, e o faz com elegante franqueza. Trata o decorrer dos acontecimentos, desde o início do segundo mandato, sem ceder a impulsos de militância.

Conduz a exposição do cerco intransponível a Dilma, e a original conduta por ela mantida, sem se perder em considerações dispensáveis e sem perder, jamais, a noção do que refletiria, de fato, a essência do testemunhado.

O texto excelente de Rodrigo de Almeida leva a uma leitura agradável, que a boa edição da LeYa mais honraria se não desprezasse o índice onomástico. Artigo de Janio de Freitas

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