quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Manuela d’Ávila defende maior participação popular no Parlamento


Por Livia Araújo
De volta ao Rio Grande do Sul como o nome mais votado para uma cadeira na Assembleia Legislativa no pleito de 2014, com 222.436 sufrágios, Manuela d’Ávila (PCdoB) traz de Brasília, onde exerceu dois mandatos como deputada federal, a convicção de ter realizado tarefas importantes, como a liderança da bancada e a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. No entanto, segundo a parlamentar, “por mais próximo que teu mandato esteja do povo, não é igual a estar na rua caminhando e poder conversar com as pessoas, ter o ouvido aberto e poder refletir e sentir as transformações da sociedade”

Com isso, Manuela volta disposta a estar mais perto de suas origens políticas, no caso de movimentos sociais como o de estudantes, e ampliar a presença popular no Legislativo, onde ela acredita que existem “setores que têm receio de que essa participação acabe substituindo o Parlamento, quando é o que o reforça”, avalia, nesta 
Em sua futura atuação na Assembleia, promete questionar o atual modus operandi da Casa. Com a Mesa Diretora atualmente se revezando entre os partidos com as quatro maiores bancadas, a deputada reforça que o Parlamento precisa estar atento à “dispersão partidária” ocorrida nas eleições, que permitiu que o próprio PCdoB aumentasse seu espaço na casa, conquistando mais uma cadeira, além da entrada de novos partidos como o P-Sol, PV e PSD.
De acordo com a deputada, a atuação parlamentar preenche, por enquanto, seus planos em relação a seu futuro político. Candidata à prefeitura de Porto Alegre nas eleições de 2008 e 2012, Manuela parece preocupar-se mais com uma união entre as diferentes siglas de seu polo político. “Tivemos uma dispersão da esquerda e fomos derrotados. Acho que temos diversas pessoas que podem adquirir competitividade no processo, se estivermos unidos em torno do melhor nomes”, pontuou.

JC - A senhora volta a legislar no Rio Grande do Sul depois de dois mandatos como deputada federal. Quais experiências traz de Brasília e como elas influenciarão em sua atuação na Assembleia Legislativa?
Manuela d’Ávila - Eu fiquei oito anos em Brasília. Foi a maior parte da minha juventude, então não dá para mensurar o que eu era quando fui e o que eu sou agora. Brasília nos ensina a ver o Brasil de um jeito muito mais crítico, mas também de uma maneira mais generosa, pois nos faz enxergar o esforço do povo brasileiro em todas as regiões. Ao mesmo tempo, cumpri tarefas importantes. Fui líder da minha bancada, uma experiência extraordinária porque o Colégio de Líderes, em Brasília,  tem um poder bastante relevante. Eu também relatei leis importantes. As pessoas subestimam muito isso, dizem que “ninguém aprova nada em Brasília”. Eu não tenho essa experiência frustrante, pois aprovei projetos, lutei pelo movimento estudantil, como na lei dos estágios. Eu aprendi a valorizar os espaços do Parlamento de outra maneira, como as comissões temáticas. Quanto à Assembleia, é uma outra experiência, porque é desafiador estar perto do povo, e foi essa uma das principais razões de eu ter escolhido voltar. Tenho uma origem no movimento social e estudantil. Em Brasília, eu presidi a Comissão de Direitos Humanos, que tem uma atuação cotidiana com os movimentos sociais, mas por mais próximo que teu mandato esteja do povo, não é igual a estar na rua caminhando e poder conversar com as pessoas, ter o ouvido aberto e poder refletir, sentir as transformações da sociedade.
JC - As jornadas de junho de 2013 tornaram esse contato com as pessoas mais necessário?
Manuela – Sim, mais ainda. Eu fiquei curiosa também para entender mais e tentar compreender as mudanças que ocorreram em quase uma década que eu fiquei lá. Claro que sempre voltei para o Rio Grande do Sul, concorri em duas eleições a prefeita de Porto Alegre, mas o cotidiano da minha atuação parlamentar era lá. Essa proximidade com a população, que eu tive na Câmara de Vereadores é muito desafiadora, muito legal.
JC - Como avalia a participação dos movimentos sociais nas instâncias políticas, e como isso pode ampliar sua atuação no Estado?
Manuela - De diversas maneiras. O governador Tarso Genro (PT) manteve os canais de diálogo com a população abertos, criando mecanismos para isso, mas eu sinto que o poder Legislativo, embora de portas abertas, ainda tem receio do papel da população para legislar. Para ter projeto de iniciativa popular em Brasília, são necessárias 1,5 milhão de assinaturas somente para tramitar, porque ter um projeto não significa que ele será aprovado. Lá, a gente conseguiu implementar o e-democracia, que é uma ferramenta de participação direta na construção da lei e é pouquíssimo usada. A participação popular avançou, mas, por outro lado, basta ver o que o Congresso fez com o decreto dos conselhos. Como o Parlamento é questionado muitas vezes, talvez existam setores que temem que essa participação acabe substituindo o parlamentar, quando na minha opinião é o que reforça, pois tu tens mais legitimidade, e escutas mais a população mesmo depois de eleito.
JC – A senhora já entra na Assembleia em uma situação de oposição. Com quais questões acredita que lidará nos próximos quatro anos, com o governo José Ivo Sartori (PMDB)?
Manuela - Estou nessa posição porque a população quis. A candidatura que defendíamos foi derrotada, mas não construímos nosso mandato para desconstruir o trabalho do governador eleito. Eu já fui oposição ao ex-prefeito José Fogaça (PMDB), mas o projeto de lei das parcerias público-privadas foi aprovado com voto do PCdoB, e também a reforma administrativa que ele propôs. Aprovamos projetos do prefeito porque julgávamos que eram os melhores. Para mim, o grande debate é como o governador eleito vai coordenar a economia do Rio Grande do Sul.  Defendíamos que era o crescimento da economia que proporcionaria o alívio das contas do Estado, e isso passava por investimentos sociais. Então, qualquer medida que restrinja isso, que faça com que a população tenha menos acesso à saúde, ao Ensino Médio, à política de combate à violência social, terão opinião contrária do PCdoB. Mas a bola voltou para o meio de campo. Eu conheço muito pouco do que o governador Sartori pretende fazer porque, assim como todo o Estado, não fui apresentada ao programa de governo dele. Mas nós nos balizaremos pelo compromisso de tentar melhorar o Estado.
JC - A senhora acredita que a oposição ao governo Sartori será mais difícil do que a que houve durante o governo Tarso?
Manuela - Acho que sim, porque a oposição ao governador Tarso conta com coisas muito bem construídas ao longo da última década na sociedade brasileira, como o antipetismo, que é despolitizado e descaracterizado de questões concretas. Isso foi construído por setores da imprensa de maneira muito competente ao longo da última década, e a oposição ao governador Tarso se valeu disso. Entretanto, nós nos valeremos apenas da luta política, real, em cima de causas e coisas que acontecerão, então, acho que é mais complicado, porque temos menos aliados poderosos, como alguns setores da imprensa que são permanentemente antipetistas, mas na verdade são antiesquerda.
JC – O PCdoB e novos partidos que estão ingressando na Assembleia reuniram-se para implementar ações conjuntas. É importante a participação das bancadas minoritárias na Mesa Diretora?
Manuela - É importante que os grandes partidos percebam que os pequenos estão na Assembleia porque o povo quis. Mesmo que hoje não estejamos no grupo dos partidos com apenas um deputado, nós temos essa sensação de que os grandes partidos têm dificuldade de aceitar que a pluralidade da política brasileira não se dá pelos partidos, mas sim pela vontade do povo. Se eles acham razoável o revezamento da presidência da Assembleia entre eles, também tem de haver razoabilidade de explicar por que as comissões temáticas não se revezam de ano a ano, como o Congresso Nacional faz. Assim como o deputado que faz mais e o que faz menos votos são iguais, do ponto de vista legal, os partidos também são iguais. A dispersão partidária foi um fenômeno e um recado da população para Assembleia, então essa é a reflexão que a Mesa Diretora e o conjunto dos partidos têm que fazer, na minha modesta opinião.
JC – É possível que os partidos minoritários lancem conjuntamente um candidato à presidência da Assembleia?
Manuela - Eu nunca cogitei essa hipótese e acho que nem eles. Nosso debate se deu bem mais em torno de questões políticas da Casa, porque todas as medidas que foram anunciadas publicamente eram medidas restritivas à participação de sete partidos, o que não julgo adequado.
JC – Além de conquistar mais uma vaga na Assembleia, o PCdoB manteve uma vaga na bancada gaúcha na Câmara dos Deputados. O partido pretende buscar um protagonismo maior, a exemplo do PSB, que historicamente fazia composições com o PT?
Manuela - Nosso caminho vem sendo construído de maneira coerente ao longo de 90 e poucos anos. O PSB construiu outro caminho, mas quem teve candidatura própria à prefeitura de Porto Alegre fomos nós, em 2008 e 2012, com apoio deles, então o que nós julgamos é que era o caminho mais adequado. Nossa premissa não é o protagonismo a qualquer preço. Se não formos protagonistas, estaremos junto com outros partidos, como na eleição de 2014. A continuidade do governo Tarso era muito importante no Rio Grande do Sul, tivemos a candidatura para vice, com Abigail Pereira, mas não fomos o partido que tinha candidato a governador. Em 2012, achávamos que éramos o partido com mais condições de vencer a eleição municipal. Outros não julgaram da mesma forma, tivemos a dispersão da esquerda e fomos derrotados. A vida tem que justificar o protagonismo, se não ele é sem sentido.
JC - O que muda para 2016? Como vislumbra seu futuro político?
Manuela - Ainda não refleti sobre minha participação no processo eleitoral de 2016. Hoje, tenho muito mais razões para continuar sendo deputada estadual nos próximos quatro anos do que para concorrer à prefeitura. Quero ter um mandato conectado com a população, aproveitar uma experiência que nunca tive de ser deputada estadual no Rio Grande do Sul e ajudar meu Estado. Como presidente estadual do PCdoB, acho que nosso campo político tem a obrigação de estar unido para enfrentar as eleições e desafios de Porto Alegre. Temos diversas pessoas que podem adquirir competitividade no processo, se estivermos unidos em torno do melhor nome. Tivemos duas eleições em que ficamos divididos e conhecemos o resultado disso: o aumento da desigualdade social na cidade. Temos de lutar contra isso, baixar a guarda e pensarmos no projeto e nos nomes que podem competir.
JC - Estão ocorrendo alguns embates acirrados na Assembleia neste final de ano. Um deles se refere à aposentadoria especial para os deputados. Qual sua posição a respeito?
Manuela - Há coisas que precisam ser feitas no momento certo, e acho que o Rio Grande do Sul tem outros temas relevantes para enfrentar agora, que não uma aposentadoria especial dos deputados. Acho que temos um Parlamento que precisa ser fortalecido para ser mais ouvido pela população, ser um canal de diálogo. Todo poder emana do povo e o Legislativo representa essa máxima constitucional, então, não acho que seja o momento para debatermos isso.
JC - Em 2012, a senhora recebeu o apoio da senadora Ana Amélia Lemos (PP). Esse diálogo continua? 
Manuela - Tenho uma relação muito respeitosa com a senadora Ana Amélia, acho que ela é uma mulher que tem muita força e convicção nas ideias que defende. Ela me apoiou, apesar do seu partido, e nós continuamos com a mesma relação respeitosa que tínhamos. Gosto muito da Ana, mas estivemos em palanques separados em 2014 porque, ao contrário do que diziam naquela ocasião, não fizemos um acordo mútuo de apoio eleitoral. Nós duas, pautadas pelas nossas convicções, estivemos juntas em 2012 e separadas em 2014. 
Perfil
Manuela d’Ávila (PCdoB) nasceu em Porto Alegre, em 1981. É formada em jornalismo pela Pucrs. Iniciou sua trajetória política no movimento estudantil, em 1999. Dois anos depois, em 2001, ingressou na política pelo PCdoB. Integrou o Conselho Universitário da Ufrgs, coordenadora do Centro de Estudantes de Ciências Sociais, diretora nacional da União da Juventude Socialista (UJS), em 2002, além de vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), em 2003, e presidente estadual da entidade, em 2005. Em 2004, foi eleita a mais jovem vereadora de Porto Alegre. Em 2006, elegeu-se como a deputada federal mais votada  do Estado. Em 2008, foi candidata à prefeitura de Porto Alegre, sua terra natal. Em 2010, foi a deputada federal mais votada da história do Rio Grande do Sul, com 482.590 votos. Em 2012, concorreu à prefeitura de Porto Alegre e ficou em segundo lugar. Nas eleições de 2014, concorreu à Assembleia Legislativa e foi a candidata no Estado com mais votos.

FONTE> Jornal do Comércio 

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