Por Livia Araújo
De volta ao Rio Grande do Sul como o nome
mais votado para uma cadeira na Assembleia Legislativa no pleito de 2014, com
222.436 sufrágios, Manuela d’Ávila (PCdoB) traz de Brasília, onde exerceu dois
mandatos como deputada federal, a convicção de ter realizado tarefas
importantes, como a liderança da bancada e a presidência da Comissão de
Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. No entanto, segundo a
parlamentar, “por mais próximo que teu mandato esteja do povo, não é igual a
estar na rua caminhando e poder conversar com as pessoas, ter o ouvido aberto e
poder refletir e sentir as transformações da sociedade”
Com isso, Manuela volta disposta a
estar mais perto de suas origens políticas, no caso de movimentos sociais como
o de estudantes, e ampliar a presença popular no Legislativo, onde ela acredita
que existem “setores que têm receio de que essa participação acabe substituindo
o Parlamento, quando é o que o reforça”, avalia, nesta
Em sua futura atuação na Assembleia,
promete questionar o atual modus operandi da Casa. Com a Mesa Diretora
atualmente se revezando entre os partidos com as quatro maiores bancadas, a
deputada reforça que o Parlamento precisa estar atento à “dispersão partidária”
ocorrida nas eleições, que permitiu que o próprio PCdoB aumentasse seu espaço
na casa, conquistando mais uma cadeira, além da entrada de novos partidos como
o P-Sol, PV e PSD.
De acordo com a deputada, a atuação
parlamentar preenche, por enquanto, seus planos em relação a seu futuro
político. Candidata à prefeitura de Porto Alegre nas eleições de 2008 e 2012,
Manuela parece preocupar-se mais com uma união entre as diferentes siglas de
seu polo político. “Tivemos uma dispersão da esquerda e fomos derrotados. Acho
que temos diversas pessoas que podem adquirir competitividade no processo, se
estivermos unidos em torno do melhor nomes”, pontuou.
JC - A senhora volta a legislar no Rio Grande do Sul depois de dois mandatos como deputada federal. Quais experiências traz de Brasília e como elas influenciarão em sua atuação na Assembleia Legislativa?
JC - A senhora volta a legislar no Rio Grande do Sul depois de dois mandatos como deputada federal. Quais experiências traz de Brasília e como elas influenciarão em sua atuação na Assembleia Legislativa?
Manuela d’Ávila - Eu fiquei oito anos
em Brasília. Foi a maior parte da minha juventude, então não dá para mensurar o
que eu era quando fui e o que eu sou agora. Brasília nos ensina a ver o Brasil
de um jeito muito mais crítico, mas também de uma maneira mais generosa, pois
nos faz enxergar o esforço do povo brasileiro em todas as regiões. Ao mesmo
tempo, cumpri tarefas importantes. Fui líder da minha bancada, uma experiência
extraordinária porque o Colégio de Líderes, em Brasília, tem um poder
bastante relevante. Eu também relatei leis importantes. As pessoas subestimam
muito isso, dizem que “ninguém aprova nada em Brasília”. Eu não tenho essa
experiência frustrante, pois aprovei projetos, lutei pelo movimento estudantil,
como na lei dos estágios. Eu aprendi a valorizar os espaços do Parlamento de
outra maneira, como as comissões temáticas. Quanto à Assembleia, é uma outra
experiência, porque é desafiador estar perto do povo, e foi essa uma das
principais razões de eu ter escolhido voltar. Tenho uma origem no movimento social
e estudantil. Em Brasília, eu presidi a Comissão de Direitos Humanos, que tem
uma atuação cotidiana com os movimentos sociais, mas por mais próximo que teu
mandato esteja do povo, não é igual a estar na rua caminhando e poder conversar
com as pessoas, ter o ouvido aberto e poder refletir, sentir as transformações
da sociedade.
JC - As jornadas de junho de 2013
tornaram esse contato com as pessoas mais necessário?
Manuela – Sim, mais ainda. Eu
fiquei curiosa também para entender mais e tentar compreender as mudanças que
ocorreram em quase uma década que eu fiquei lá. Claro que sempre voltei para o
Rio Grande do Sul, concorri em duas eleições a prefeita de Porto Alegre, mas o
cotidiano da minha atuação parlamentar era lá. Essa proximidade com a população,
que eu tive na Câmara de Vereadores é muito desafiadora, muito legal.
JC - Como avalia a participação dos
movimentos sociais nas instâncias políticas, e como isso pode ampliar sua
atuação no Estado?
Manuela - De diversas
maneiras. O governador Tarso Genro (PT) manteve os canais de diálogo com a
população abertos, criando mecanismos para isso, mas eu sinto que o poder
Legislativo, embora de portas abertas, ainda tem receio do papel da população
para legislar. Para ter projeto de iniciativa popular em Brasília, são
necessárias 1,5 milhão de assinaturas somente para tramitar, porque ter um
projeto não significa que ele será aprovado. Lá, a gente conseguiu implementar
o e-democracia, que é uma ferramenta de participação direta na construção da
lei e é pouquíssimo usada. A participação popular avançou, mas, por outro lado,
basta ver o que o Congresso fez com o decreto dos conselhos. Como o Parlamento
é questionado muitas vezes, talvez existam setores que temem que essa
participação acabe substituindo o parlamentar, quando na minha opinião é o que
reforça, pois tu tens mais legitimidade, e escutas mais a população mesmo
depois de eleito.
JC – A senhora já entra na Assembleia
em uma situação de oposição. Com quais questões acredita que lidará nos
próximos quatro anos, com o governo José Ivo Sartori (PMDB)?
Manuela - Estou nessa posição
porque a população quis. A candidatura que defendíamos foi derrotada, mas não
construímos nosso mandato para desconstruir o trabalho do governador eleito. Eu
já fui oposição ao ex-prefeito José Fogaça (PMDB), mas o projeto de lei das
parcerias público-privadas foi aprovado com voto do PCdoB, e também a reforma
administrativa que ele propôs. Aprovamos projetos do prefeito porque julgávamos
que eram os melhores. Para mim, o grande debate é como o governador eleito vai
coordenar a economia do Rio Grande do Sul. Defendíamos que era o
crescimento da economia que proporcionaria o alívio das contas do Estado, e
isso passava por investimentos sociais. Então, qualquer medida que restrinja isso,
que faça com que a população tenha menos acesso à saúde, ao Ensino Médio, à
política de combate à violência social, terão opinião contrária do PCdoB. Mas a
bola voltou para o meio de campo. Eu conheço muito pouco do que o governador
Sartori pretende fazer porque, assim como todo o Estado, não fui apresentada ao
programa de governo dele. Mas nós nos balizaremos pelo compromisso de tentar
melhorar o Estado.
JC - A senhora acredita que a oposição
ao governo Sartori será mais difícil do que a que houve durante o governo
Tarso?
Manuela - Acho que sim,
porque a oposição ao governador Tarso conta com coisas muito bem construídas ao
longo da última década na sociedade brasileira, como o antipetismo, que é
despolitizado e descaracterizado de questões concretas. Isso foi construído por
setores da imprensa de maneira muito competente ao longo da última década, e a
oposição ao governador Tarso se valeu disso. Entretanto, nós nos valeremos
apenas da luta política, real, em cima de causas e coisas que acontecerão,
então, acho que é mais complicado, porque temos menos aliados poderosos, como
alguns setores da imprensa que são permanentemente antipetistas, mas na verdade
são antiesquerda.
JC – O PCdoB e novos partidos que estão
ingressando na Assembleia reuniram-se para implementar ações conjuntas. É
importante a participação das bancadas minoritárias na Mesa Diretora?
Manuela - É importante que os
grandes partidos percebam que os pequenos estão na Assembleia porque o povo
quis. Mesmo que hoje não estejamos no grupo dos partidos com apenas um
deputado, nós temos essa sensação de que os grandes partidos têm dificuldade de
aceitar que a pluralidade da política brasileira não se dá pelos partidos, mas
sim pela vontade do povo. Se eles acham razoável o revezamento da presidência da
Assembleia entre eles, também tem de haver razoabilidade de explicar por que as
comissões temáticas não se revezam de ano a ano, como o Congresso Nacional faz.
Assim como o deputado que faz mais e o que faz menos votos são iguais, do ponto
de vista legal, os partidos também são iguais. A dispersão partidária foi um
fenômeno e um recado da população para Assembleia, então essa é a reflexão que
a Mesa Diretora e o conjunto dos partidos têm que fazer, na minha modesta
opinião.
JC – É possível que os partidos minoritários
lancem conjuntamente um candidato à presidência da Assembleia?
Manuela - Eu nunca cogitei
essa hipótese e acho que nem eles. Nosso debate se deu bem mais em torno de
questões políticas da Casa, porque todas as medidas que foram anunciadas publicamente
eram medidas restritivas à participação de sete partidos, o que não julgo
adequado.
JC – Além de conquistar mais uma vaga
na Assembleia, o PCdoB manteve uma vaga na bancada gaúcha na Câmara dos
Deputados. O partido pretende buscar um protagonismo maior, a exemplo do PSB,
que historicamente fazia composições com o PT?
Manuela - Nosso caminho vem
sendo construído de maneira coerente ao longo de 90 e poucos anos. O PSB
construiu outro caminho, mas quem teve candidatura própria à prefeitura de
Porto Alegre fomos nós, em 2008 e 2012, com apoio deles, então o que nós
julgamos é que era o caminho mais adequado. Nossa premissa não é o protagonismo
a qualquer preço. Se não formos protagonistas, estaremos junto com outros
partidos, como na eleição de 2014. A continuidade do governo Tarso era muito
importante no Rio Grande do Sul, tivemos a candidatura para vice, com Abigail
Pereira, mas não fomos o partido que tinha candidato a governador. Em 2012,
achávamos que éramos o partido com mais condições de vencer a eleição
municipal. Outros não julgaram da mesma forma, tivemos a dispersão da esquerda
e fomos derrotados. A vida tem que justificar o protagonismo, se não ele é sem
sentido.
JC - O que muda para 2016? Como
vislumbra seu futuro político?
Manuela - Ainda não refleti
sobre minha participação no processo eleitoral de 2016. Hoje, tenho muito mais
razões para continuar sendo deputada estadual nos próximos quatro anos do que
para concorrer à prefeitura. Quero ter um mandato conectado com a população,
aproveitar uma experiência que nunca tive de ser deputada estadual no Rio
Grande do Sul e ajudar meu Estado. Como presidente estadual do PCdoB, acho que
nosso campo político tem a obrigação de estar unido para enfrentar as eleições
e desafios de Porto Alegre. Temos diversas pessoas que podem adquirir
competitividade no processo, se estivermos unidos em torno do melhor nome.
Tivemos duas eleições em que ficamos divididos e conhecemos o resultado disso:
o aumento da desigualdade social na cidade. Temos de lutar contra isso, baixar
a guarda e pensarmos no projeto e nos nomes que podem competir.
JC - Estão ocorrendo alguns embates
acirrados na Assembleia neste final de ano. Um deles se refere à aposentadoria
especial para os deputados. Qual sua posição a respeito?
Manuela - Há coisas que
precisam ser feitas no momento certo, e acho que o Rio Grande do Sul tem outros
temas relevantes para enfrentar agora, que não uma aposentadoria especial dos
deputados. Acho que temos um Parlamento que precisa ser fortalecido para ser
mais ouvido pela população, ser um canal de diálogo. Todo poder emana do povo e
o Legislativo representa essa máxima constitucional, então, não acho que seja o
momento para debatermos isso.
JC - Em 2012, a senhora recebeu o apoio
da senadora Ana Amélia Lemos (PP). Esse diálogo continua?
Manuela - Tenho uma relação
muito respeitosa com a senadora Ana Amélia, acho que ela é uma mulher que tem
muita força e convicção nas ideias que defende. Ela me apoiou, apesar do seu
partido, e nós continuamos com a mesma relação respeitosa que tínhamos. Gosto
muito da Ana, mas estivemos em palanques separados em 2014 porque, ao contrário
do que diziam naquela ocasião, não fizemos um acordo mútuo de apoio eleitoral.
Nós duas, pautadas pelas nossas convicções, estivemos juntas em 2012 e
separadas em 2014.
Perfil
Manuela d’Ávila (PCdoB) nasceu em
Porto Alegre, em 1981. É formada em jornalismo pela Pucrs. Iniciou sua
trajetória política no movimento estudantil, em 1999. Dois anos depois, em
2001, ingressou na política pelo PCdoB. Integrou o Conselho Universitário da
Ufrgs, coordenadora do Centro de Estudantes de Ciências Sociais, diretora
nacional da União da Juventude Socialista (UJS), em 2002, além de
vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), em 2003, e presidente
estadual da entidade, em 2005. Em 2004, foi eleita a mais jovem vereadora
de Porto Alegre. Em 2006, elegeu-se como a deputada federal mais votada
do Estado. Em 2008, foi candidata à prefeitura de Porto Alegre, sua terra
natal. Em 2010, foi a deputada federal mais votada da história do Rio Grande do
Sul, com 482.590 votos. Em 2012, concorreu à prefeitura de Porto Alegre e ficou
em segundo lugar. Nas eleições de 2014, concorreu à Assembleia Legislativa e
foi a candidata no Estado com mais votos.
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