segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Enquanto o 1% de cima tem 51%, os 50% de baixo só têm 1%

Para deixar ainda mais escandaloso o quadro, se fazemos as contas com os 10% mais ricos do planeta, veremos que eles acumulam 89% de toda a riqueza do mundo! Esta é a nova cifra calculada pelo informe anual da riqueza global do banco Credit Suisse. A cada ano, o Credit Suisse apresenta este informe, escrito pelos professores Tony Shorrocks, James Davies e Rodrigo Lluberas – que antes o elaboravam para a ONU.


Costumo escrever sobre ele a cada ano, em artigos que geralmente terminam se posicionando entre os mais populares.

Da última vez que tratei dos resultados desses informes, o 1% mais rico tinha 48% da riqueza global. Logo, neste um ano e meio, a desigualdade global aumentou ainda mais, segundo a pesquisa. 

Entretanto, a proporção de riqueza acumulada pelo 1% ou pelos 10% mais ricos se reduziu entre 2000 e 2007, de um 50% (percentual similar ao deste último estudo) a um 46%. Uma diferença não muito grande, mas que marcava uma tendência de queda, que se inverteu depois da crise financeira, com os setores mais ricos voltando a perceber os níveis de concentração observados no começo deste século.

Os investigadores do Credit Suisse estimam que estas mudanças refletem principalmente a importância relativa dos ativos financeiros dos lares, que voltaram a aumentar de valor a partir de 2008, fazendo crescer a riqueza de muitos dos países mais ricos, e de muitas das pessoas mais ricas, em todo o mundo. Apesar de a proporção dos ativos financeiros se reduzir este ano, as partes dos grupos de riqueza superiores continuaram aumentando. No outro extremo da pirâmide da riqueza mundial, a metade inferior dos adultos possui coletivamente menos de 1% da riqueza total.

A principal razão principal desta enorme desigualdade é que há muitos pobres (em termos de riqueza) no mundo. Não se necessita muito para se estar na parte de cima da pirâmide. Deduzidas as dívidas, a pessoa só necessita ter 3,7 dólares para formar parte do grupo dos possuidores de riqueza.

Entretanto, se necessita cerca de 77 mil dólares para pertencer aos 10% mais ricos, e 798 mil dólares para se chegar ao 1%, o patamar superior, onde estão os donos de mais da metade da riqueza mundial. Assim, se você é dono de uma casa (ou seja, não paga aluguel) em qualquer cidade importante num país desenvolvido do hemisfério norte, você provavelmente é parte desse 1% superior. Não se sente rico por isso? Pois o cenário que demonstra essa riqueza é o do contraponto, a situação dos pobres, que são a grande maioria das pessoas no mundo: sem propriedade, sem dinheiro e, evidentemente sem ações, títulos ou bonos.

A investigação mostra que 3,5 bilhões de pessoas – 73% de todos os adultos do mundo – possuem bens e renda inferiores a 10 mil dólares em 2016. Outros 900 milhões de adultos (19% da população mundial) estão no leque entre 10 mil e 100 mil dólares. Os pobres se concentram no continente africano, na Índia e nas nações mais pobres da Ásia. Porém, também há um número significativo de pessoas que são pobres segundo esses parâmetros, e que vivem na América do Norte e na Europa – entre eles 9% dos norte-americanos, a maioria com um patrimônio líquido negativo, e 34% dos europeus. Essas pessoas não só carecem de riquezas como também vivem endividadas.

E quem são os que estão cada vez melhor? Certamente não são os indianos. A Índia tem só 3,1% das pessoas de classe média do mundo (com uma riqueza de entre 10 mil e 100 mil dólares) e essa proporção praticamente não mudou nos últimos anos. Pelo contrário, a China conta com 33% da população em níveis médios de riqueza, dez vezes mais que Índia, e essa proporção se duplicou desde o ano 2000. Isto nos mostra que a expansão econômica sem precedentes da China tirou centenas de milhões de pessoas da pobreza, ainda que a desigualdade tenha aumentado.

Além disso, o número de milionários, que se reduziu em 2008, mostrou uma rápida recuperação depois da crise financeira, e agora é mais que o dobro da cifra de 2000. Na atualidade, há 32,9 milhões de milionários a nível mundial (ou sejam adultos com mais de 1 milhão de dólares em propriedades ou economias, descontadas as dívidas). Há somente 140 mil pessoas em todo o mundo com patrimônio superior a 50 milhões de dólares. E também há mais de 2 mil multimilionários, que são realmente os donos do mundo.

Supondo que não haverá mudanças na tendência de aumento da desigualdade com respeito à riqueza mundial, se espera que haja mais 945 multimilionários nos próximos cinco anos, elevando o total a quase 3 mil. Mais de 300 desses novos multimilionários devem ser da América do Norte. A China, segundo esses cálculos, somará mais novos multimilionários que toda Europa junta, situando o total de chineses nesse patamar acima dos. O Credit Suisse estima que a riqueza global total agora é de 334 bilhões de dólares, ao redor de quatro vezes o PIB mundial anual. No começo deste século, houve um rápido aumento da riqueza mundial, com um crescimento mais rápido na China, na Índia e em outras economias emergentes, que representaram 25% do aumento da riqueza, apesar de que possuíam somente 12% da riqueza mundial no ano 2000.

A riqueza mundial se reduziu em 2008, mas mostrou uma lenta tendência de recuperação a partir de então, com uma taxa significativamente mais baixa que a exibida antes da crise financeira. De 2010 em diante, a riqueza (em dólares) caiu em todas as regiões do planeta fora da América do Norte, Ásia-Pacífico e China. A riqueza per capita por adulto registrou crescimento pífio, e a riqueza média caiu desde 2010. Logo, o adulto médio é cada vez mais pobre.

Nos últimos 12 meses, a riqueza mundial aumentou em 1,4%, mal podendo manter o ritmo do crescimento da população. Como resultado, neste ano de 2016, a riqueza média por adulto se manteve sem mudanças pela primeira vez desde 2008, aproximadamente uns 52,8 dólares. Portanto, a população mundial em seu conjunto não se tornou mais rica no último ano e meio, mas a desigualdade aumentou.

* Michael Roberts é um reconhecido economista marxista britânico.

Tradução: Victor Farinelli


 Fonte: The Next Recession

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